Ѽ Capítulo 9: Vermelho-Sangue  

Posted by: Venenosa

- Meu amor! O que está fazendo escondidinho aí? – Exclamou Jacky ao avistar Rafael, incrédulo e paralisado, encostado na parede do beco. Tinha sabido pelas más línguas do incidente com o Daniel, mas estava pouco se lixando. Ela estava mais feliz com a reconciliação que tiveram pelo telefone na noite anterior, logo após a saída do garoto da festa da Vick.

- Não encoste em mim! – Ele urrou com toda a força que poderia, se afastando da morena de olhos castanhos profundos. Ela ficou assustada, ontem mesmo tinha ouvido pelo telefone que era a única pessoa em quem ele poderia confiar e a única garota que sempre fora fiel ao relacionamento e que, realmente, gostava dele. Não estava entendendo essa mudança repentina de humor.

- Qual foi o problema agora, amor? É por causa do Daniel? O que é? Eu sei que não foi sua culpa... – Ela tentou acalmá-lo enquanto ele enterrava as mãos nos cabelos e abaixava a cabeça procurando não ouvi-la.

- Pára de fingir! CHEGA! – Gritou com ela no nível mais algo possível.

- Fingir? Rafael! – Lágrimas começaram a despencar sobre sua face. Está certo que não era um anjo de pessoa, tinha suas picuinhas com Vicky e, principalmente, com Mel, aquela que sempre que tinha oportunidade tentava-lhe roubar Rafa, mas nunca fingira nada com relação aos seus sentimentos por ele. Não estava entendendo porque estava sendo alvo da gritaria e não suportava que gritassem consigo.

- O quê? Você achou que eu nunca fosse descobrir? O quão estúpido você acha que eu sou, Jaqueline? Você achou que eu nunca fosse desconfiar dessas suas manipulações diabólicas? Eu não sou sua marionete, caramba!

- Descobrir o quê? Por que você ta gritando comigo? – Disse ela entre lágrimas e choro. – Você está sendo injusto! Eu não acho você estúpido!

- Mas eu sou, Jaqueline! Eu sou! E sabe por quê? Porque eu acreditei nessa armação sua e das suas amiguinhas!

- O quê? Dê quê está falando? Do damasco? Eu não achei que uma alergia te atingiria tanto! – Ela começou a proferir as palavras rapidamente tentando entender o motivo da discussão. Sim, era culpada no caso do damasco, mas por que isso agredira tanto o Rafael? Não sabia que ele era tão amigo da Vitória...

- Pára de dissimular! Estou falando da gravidez, droga! Da possível gravidez da Mel antes de tomar um monte daquelas pílulas malucas. Do filho que você, Amanda e Bianca inventaram que era do Kadu, meu melhor amigo! Isso foi o fim, Jaqueline, o fim. Você conseguiu, me destruiu. Destruiu minhas amizades, destruiu minha consciência, me fez machucar um dos meus melhor amigos, destruiu minha relação com a pessoa que mais amo no mundo e tudo pra quê? Pra eu ter só você, não é?

- Não! Eu não sabia que era mentira!

- Você é doente. Precisa de um psiquiatra.

- Não! – Ela berrou entre as lágrimas que escorriam sobre suas roupas de grife. Suas mãos trêmulas seguraram a camiseta ainda suja de sangue do ex-namorado, tentou mirá-lo nos olhos, visualizou sua imagem embaçada por entre o choro incessante. – Acredita em mim!

Ele usou a força para retirar as mãos dela grudadas em sua roupa.

- Nunca mais se atreva a encostar em mim. – Fez a ameaça e saiu andando, notando que, as pessoas que ainda estavam paradas na porta do colégio esperando alguém buscá-las ao fim da aula, o encaravam com repulsa, certamente já sabiam do caso do Daniel. Pegou um táxi o mais rápido possível para tentar consertar as coisas.

Jaqueline ajoelhou-se ainda chorando no lugar escuro em que se encontrava, estivera tão feliz por ter reatado o namoro e agora estava em prantos em um local imundo. De repente, uma raiva mortal começou a correr em suas veias, Bianca a enganara. Nunca se importou em espalhar fofocas que fossem mentira contanto que soubesse a verdade, contudo, Bianca a fizera acreditar nisso, usou-a como peça do próprio jogo e isso era imperdoável.

~ Ѽ ~

- Como se sente?

- Acho que melhor... – Mellanie tentou sorrir para Alex, tinha acabado de acordar e ele ainda estava ali, estava sendo uma boa companhia.

- Que bom, porque está na hora do remédio! – Ele se levantou e buscou um frasquinho na prateleira do cômodo em que ela estava internada.

- Ah não! – Mellanie reclamou, o remédio tinha gosto ruim, mas bebeu-o sem fazer muito escândalo. – Bem, acho que poderia ser pior... Eu poderia estar tomando óleo de fígado de bacalhau, por exemplo. – Fez uma careta.

- Ah, então já está até fazendo piadinhas? Acho que melhorou mesmo.

- Se for usar disso para me fazer tomar outro remédio... Ainda estou muito mal. – Ela sorriu.

- Não, não... É que, bem cedinho, chegou uma coisa pra você... Eu não quis te entregar mais cedo, percebi que você e Vicky tinham tido uma discussão, quis esperar você ficar melhor, me perdoe.

- Não, você fez bem! Acho que eu não teria cabeça pra me ocupar com outra coisa mesmo... – Respondeu enquanto pegava o pacote que Alex a entregava. - Por falar nisso, ela ligou?

- Ainda não, mas acho que ainda está com um pouco de alergia, deve ser por isso. – Ele tentou despreocupá-la. Sabia de quem era a correspondência, estava bem identificado na etiqueta e, tendo em vista os boatos que Mellanie lhe contara mais cedo, sabia que o embrulho não poderia ser coisa boa, por isso quis esperar uma ligeira melhora do humor para entregar.

Ela fixou o olhar no pacote, era uma caixa de papelão de tamanho pequeno lacrada com fita adesiva comum, nada muito luxuoso, parecia mais uma encomenda. Leu a etiqueta que continha o nome de Rafael Montez em letras bem grandes, estremeceu.

- Está tudo bem? Quer que eu saia? – Alex perguntou tentando ser delicado, talvez ela quisesse abrir sozinha, não era curioso.

- Não, acho que... Acho que tudo bem. – Ela tentou sorrir. Encarou a caixa por mais algum tempo, se perguntou o que poderia estar lá dentro. Certamente, o colégio inteiro já estava sabendo do boato de um filho que, na verdade, talvez nem existiria juntado à mentira deslavada da paternidade do namorado de sua melhor amiga. Portanto, Rafa já deveria estar sabendo e, conhecendo-o bem como ela o conhecia , deveria estar puto da vida. Ela ainda estava meio zonza por ter acabado de acordar e sua imaginação fértil apurou os ouvidos para escutar se haveria algum tic-tac vindo de dentro do embrulho.

Tomou coragem e começou a arrebentar, impacientemente, as fitas adesivas que prendiam o papelão. Finalmente, conseguiu abrir um buraco na correspondência e percebeu que existia pedaços de pano e um cartão pequeno lá dentro. Franziu as sobrancelhas e puxou a peça vermelha-sangue que lá havia, era um lingerie de renda minúsculo composto por uma calcinha fio dental e um top transparente quase tão pequeno quanto a parte de baixo. Ficou duplamente ofendida e boquiaberta, Alex arregalou os olhos ao ver aquilo. Tremendo de raiva, segurou o cartão que acompanhava a vestimenta, em letras sem nenhum capricho estava escrito:

“Para usar na próxima vez. Não quero que você repita o traje quando estiver com dois caras em noites seguidas de novo. Depois discutimos em que posição você me pagará o preço disso ;)
Rafael”


Mellanie não sabia se chorava ou se gritava. Arremessou a caixa, as peças vermelhas, o cartão e tudo o que estava ao seu alcance na parede, deixou a histeria tomar conta de si. Alex tentou segurar seus pulsos enquanto ela se debatia de raiva, ainda na cama do hospital e presa por alguns fios e agulhas que tentava tirar das veias no ápice da ira. Repentinamente, parou de reagir, desabou em choro nos ombros do novo amigo. Ele a abraçou sem jeito e, pela primeira vez, tinha completa solidariedade por alguém que julgava ser bom e que, de maneira nenhuma, merecia isso tudo que estava acontecendo.

- Mel! – Rafa chegara nessa hora, achava que poderia impedir que ela recebesse o pacote, tinha a pequena esperança de que só entregariam quando ela se recuperasse, mas ao chegar no quarto e ver tudo jogado pelo chão, entendeu que era tarde demais.

- O que você está fazendo aqui? – Alex falou em um tom baixo, mas firme, não queria causar um escândalo no hospital.

- Eu vim falar com ela, dê licença. – Rafael ordenou, ainda na porta, mas Alex não saiu da frente, Mellanie continuou com o rosto enterrado no travesseiro, se sentia humilhada e envergonhada.

- Você não tem nada pra falar com ela, não bastou mandar essas porcarias pra acabar com ela, mesmo sabendo que ela estava internada?

- Você não tem nada a ver com isso.

- Tenho. Tenho sim e digo mais: pra falar com ela vai ter que passar por cima de mim. – Rafael estava disposto a massacrar Alex para poder falar com ela, para poder se desculpar, mas não pôde. Colocou-se em posição de ataque, mas antes que pudesse pensar, recebeu um soco na face que o deixou atordoado. Alex recolheu a caixa, o cartão e as peças de roupas e jogou-as na cara do outro, bateu a porta do quarto. Voltou-se para a garota, ainda chorosa e indisposta a mostrar o rosto. Sentou na cama ao seu lado. – Está tudo bem... Não vou deixar ele chegar perto de você de novo... Vou lá fora agora mesmo pedir que não deixem que ele volte a entrar aqui, vou avisar pra ele, tudo bem... – Passou a mão, carinhosamente, nos cabelos negros dela.

- Não, fica aqui. – Ela respondeu, a voz abafada pelo travesseiro.

- Não vou sair daqui. – Ele sorriu.

~ Ѽ ~

Rafael estava disposto a arrebentar aquela maldita porta para conseguir consertar as coisas pelo menos com a Mel, tinha sido um perfeito idiota nos últimos tempos, ela teria que perdoar-lhe, teria entender que também fora vítima de toda a mentira. No fundo de sua consciência, sabia que não reagira ao soco dado por Alex porque, no fim das contas, era o que merecia por ter sido tão canalha.

- Mas eu já não te falei pra ficar longe? – Ouviu a voz nervosa de Bianca ressoar pelos corredores brancos do hospital.

- Não vim ver você.

- E daí? Sua presença fétida me incomoda.

- Some da minha frente.

Ele falou isso com um ar tão psicopata que ela se assustou e resolver sentar e esperar na recepção, não no corredor, como havia dito ao pai do Daniel. A verdade é que Rafael não passava de um desequilibrado, mal ouviu a mentira e já atacou um dos melhores amigos, sabe-se lá o que poderia fazer com ela, mesmo em um lugar cheio de gente. E, também, não tinha mais o que falar com ele, já tinha dado o recado, já tinha zombado da estupidez do garoto, já havia tripudiado ao máximo do fundo do poço em que ele se encontrava, estava bom o bastante, por hora.

Assim que se sentou, ouviu um toque conhecido, era o seu celular. Encarou o identificador de chamadas. Imaginou o que ela queria a essa hora, nunca telefonava por motivos insignificantes.

- Alô, Jacky?

- Onde você está? – Bianca ouviu a voz de Jaqueline trêmula e, ao mesmo tempo, fria do outro lado da linha.

- No hospital perto do seu condomínio, estou acompanhando meu namorado, que foi atacado pelo seu, aliás.

- Estou indo te encontrar. – E desligou sem falar mais uma palavra sequer.

~ Ѽ ~

Camilla deitou-se na cama do quarto mal iluminado, estava arrasada. Alex fora o único que a ajudara naquele ninho de cobras e agora não podia mais falar com ele porque alguma víbora inventara que ele era um assassino. È claro que ela o compreendia, se continuasse insistindo em ficar perto dela, iriam mesmo tirar más conclusões disso. O que restava é encontrar a fulaninha culpada por esse boato e, pela primeira vez, enfrentar uma outra pessoa e vencer.

Estava disposta a passar por cima de qualquer ridícula que tivesse inventado esse boato, mas seus pensamentos de vingança foram interrompidos pelo toque da campainha. Imaginou quem poderia ser à essa hora numa quinta-feira, dispôs-se a abrir a porta.

Era o carteiro, tinha tocado a campainha do apartamento, pois precisava que assinassem o recebimento da encomenda. “Maldito condomínio sem portaria”, pensou. Recebeu o pacote relativamente pequeno, do tamanho médio de metade de uma caixa de sapato, sentou-se para abri-lo.

Cortou o papelão com as mãos e tudo o que encontrou lá dentro fora uma caixa vermelha de veludo, abriu-a com cautela, seu queixo caiu. Um som contagiante começou a ressonar pela sala mal mobiliada, era uma caixa de música. Uma bailarina de porcelana, mas vestida com trajes de verão dançava ao som de um violão espanhol juntamente com seu par, igualmente de porcelana, vestido com uma bermuda e um colar havaiano. No verso da tampa, em letras fluorescentes estavam os dizeres:

Festa Verão Tropical
Tema praia
Neste Sábado
Rua Olhos d’água – Urca
Por Amanda Wernz
Mais detalhes no verso


Camilla levou algum tempo para se recuperar do susto, desconfiada, olhou mais uma vez para a caixa cor vermelho-sangue. Nunca dissera seu endereço à Mandy e nunca esperaria tal convite, lembrou-se do episódio do suco de uva no primeiro dia da semana. Deveria ser algum engano. Olhou os destroços da embalagem de papelão usada para a encomenda, encontrou um pedaço em que se lia, claramente, seu nome e seu endereço.
Iria prestar atenção nos comentários acerca disso no colégio amanhã e, caso não fosse mesmo uma piada de mau gosto, aceitaria o convite. Seria um ótimo lugar para começar a procurar a fofoqueira.

~ Ѽ ~

- O que você quer, Michelle?

- Quero saber porque foi embora sem mim naquela droga de colégio hoje. – A garota ruiva gritou com o pai por meio do telefone celular.

- Seu irmão foi atacado, não ficou sabendo?

- O fato de ele ser atacado me faz ir flutuando até em casa?

- Não! – O Pai estranhou a pergunta. Como aquela piveta fazia perguntas difíceis! E alguns ainda diziam que a fase era passageira.

- Então não tem justificativa. Tive que pegar um ônibus e fui parar no Catumbi e tudo por quê? Porque meu irmão levou um arranhadinho no braço, puff.

- Aliás, você poderia pelo menos perguntar como ele está!

- Se você faz questão... – Mudou drasticamente a voz para um tom polido e doce – Como meu irmão está, papai?

E quando o homem puxou o fôlego para a resposta, escutou o barulho de finalização da chamada, “menina mal educada”!

- Senhor diretor? – O homem virou-se para encarar a voz feminina que lhe chamava.

- Como vai, Srta. Deville?

- Bem, obrigada. O senhor sabe onde está a Bianca?

- Ela estava esperando na recepção dois, provavelmente ainda está lá...

- Obrigada. Tenha um bom dia.

Com toda a amargura da voz transmitida aos passos, deparou-se com Bianca na sala onde deveria mesmo estar, sentada sozinha mexendo a colher da xícara de café que segurava. Quando estava se aproximando, ela levantou a cabeça e deu um breve sorriso.

- Por que estava precisando falar tanto comigo? – Bianca se levantou e perguntou, calmamente, antes de sorrir de novo.

- Eu quero que você me ouça, e que escute com atenção. Eu vou acabar com você, vou fazer questão de pisar em você e te quebrar até não sobrar nada e quando eu...

- O quê? Por que está falando isso?

- E, quando eu terminar, - continuou Jaqueline, como se não tivesse sido interrompida - quero que você se arrependa profundamente de ter cruzado meu caminho e que se lembre claramente deste momento porque aí, aí não vai sobrar nenhuma dúvida de quem tornou a sua vida um inferno.

~ Ѽ ~

- Quem é?

- É o Alex, Vitória.

A garota estremeceu, não esperava a ligação ao pôr do sol, ainda mais dele. É claro que não fora um acontecimento ruim, pelo contrário... Mas entre essa série de desventuras, desde a briga com a Mellanie até o recebimento do convite da Mandy – o qual já estava, em mil pedaços, enfiado na lixeira - não tivera tempo para se ocupar com os devaneios acerca do Alex. Aquele cara totalmente diferente dos que, algum dia, já se relacionara, mas que causava um sentimento mais incomum que qualquer outro mesmo o tendo conhecido há, somente, uma semana.

- Aconteceu alguma coisa?

- Não, liguei para pedir um favor.

- Hum... O senhor do universo ligando para uma patty para pedir um favor? Me pergunto o que poderia ser...

- É sério... É a Mel. Olha, eu sei que vocês brigaram, não sei o motivo e nem quero, mas é que as coisas complicaram um pouco e acho que ela precisa de uma amiga.

- Exatamente, você não sabe o motivo, não pode me julgar.

- Não estou julgando, quero que entenda. Ela não tem mais ninguém.

- Ela procurou por isso. – Respondeu em tom de ponto final.

- Eu duvido muito. Ninguém quer ficar sozinho.

- E você está incluído nisso?

- Não vem ao caso. Olha, estou tentando te alertar, você não deveria jogar fora uma amizade verdadeira. Ela está sofrendo muito, dormiu agora e peguei seu número no celular dela. Ela precisa de você.

- Te encontro aí.

~ Ѽ ~

Ѽ Capítulo 8: Verdades  

Posted by: Venenosa

Mellanie abriu os olhos. Tinha passado os últimos minutos com eles fechados pensando que aquilo poderia ser uma alucinação. Não estava disposta a aceitar a perda da melhor amiga. E não era só isso. Vicky mencionou Bianca. “Se Bianca sabe, a escola inteira sabe”, afirmou. Então Rafa já sabia, nunca mais iria olhar na cara dela pensando que o tivesse traído com o seu melhor amigo e, pior, ela não poderia provar quem era o pai agora que a criança em potência já não existia. E, é claro, iria ser julgada por todo o colégio assim que voltasse às aulas. Seria sempre a “amiga traíra” ou a “galinha sem vergonha”. Sentiu vontade de chorar, mas não o fez.

- Está acordada? Vim aqui agora a pouco e você estava de olhos fechados, achei que estivesse dormindo. – Alex perguntou apoiando-se na porta do quarto de hospital.

- Estou. – Ela tentou sorrir. Não iria mostrar fraquezas.

- E então?

- Então o quê?

- Sua amiga Vitória... Saiu chorando uns vinte minutos atrás. Não acho que tenha sido a emoção. – “idiota”, Alex pensou. Era péssimo com as palavras.

- Tivemos um breve desentendimento. Nada muito sério, contudo! - Forçou um sorriso, ele não acreditou. Era ruim com as palavras, mas era bom em decifrar as pessoas.

- Quer me contar por quê?

- Então não sabe da nova mentira da Bianca, Jacky e Mandy?

- Essas meninas são fogo mesmo, não? Desde que cheguei aqui, esta semana, já tiveram uma dúzia de confusões por causa dos boatos que elas inventaram. – Estava tentando conseguir uma nova amizade, por isso mudava tanto de colégio. Era indiferente demais para se prender a alguém, mas já estava cansando da vida solitária.

- São umas cobras venenosas, que ódio.

- Fica calma, você está em recuperação. Me conta o que inventaram dessa vez. – Alex tentou acalma-la.

- Bianca, Jacky e Mandy inventaram que o filho é do Kadu. – Alex se assustou, era uma coisa que nunca teria imaginado, mas não significava que acreditava nisso. É claro que era o plano perfeito das outras para prejudicar a amizade da Mel e da Vicky. – Imagina! O namorado da minha melhor amiga! – Teve que conter as lágrimas novamente.

- Fica calma, Mel..Tenho certeza que ninguém vai acreditar nessa baboseira... Logo a Vitória vai perceber que é mentira, só dê um tempo para ela.

- É, espero que sim. – Respondeu tentando fechar o assunto, não queria ter que explicar ao Alex que, apesar de parecer legal, era praticamente um estranho que conheceu essa semana, que não era esse o problema. Que Vitória não acreditara na mentira da Bianca, mas que ficara furiosa com a mentira dela mesma, Mellanie, sua melhor amiga.
~ Ѽ ~

- E foi assim, crianças, que Napoleão perdeu a guerra. Fim.

- Finalmente esse chato se ferrou, aff. – Comentou Jacky com Bianca ao terminar a aula de história. – Não estava agüentando mais.

- Verdade. Essa aula estava durando séculos, não vou ficar surpresa se vir meu cabelo branco na próxima vez que olhar no espelho.

- 4º período é o mais chato de todos, Deus! – Jogou a cabeça por cima da carteira.

- O que estava a dizer, srta. Deville?

- Nada, sra. Guedes. – Levantou a cabeça para observar a velhinha parada em frente à sua carteira. – Estava só comentando com a Bianca como quero que o 6º período chegue logo. Tenho a sensação de que boas notícias virão no final da aula!

- Que bom, que bom. – Respondeu a velhinha simpática se direcionando para a porta, mas logo voltando-se novamente. – Deville, você viu meus óculos?

- Não senhora. – Respondeu Jaqueline mesmo percebendo que eles se encontravam sobre os cabelos grisalhos dela.

- Obrigada, vou dar mais uma olhada por aí. – Saiu da sala logo em seguida. Bianca riu maldosamente.

- Você acha que o fim da aula vai ser melhor que o recreio? – Perguntou a uma Jacky Pensativa.

- Claro, não tenho dúvidas de que o Rafa está no habitual treino de basquete depois do intervalo, ele nunca perde aquela porcaria. Quando acabar, vai vir me ver porque, adivinha: reatamos o nosso namoro! – Os olhos dela brilharam ao pensar nanisso – Graças à Melzinha que andou dando o que não deveria para quem não deveria. O que foi ótimo, para falar a verdade. Vicky deve estar mais puta do que já é! – Riu alto. – Não vai mais falar com ela, nem com Kadu. Sinceramente, nunca gostei tanto da Mellanie como estou gostando agora. Como você ficou sabendo que ela teve um caso com o Carlos Eduardo?

- Detenção no departamento de artes. – Respondeu com o mínimo de detalhes possíveis para evitar que desconfiasse a verdade.

- Sim, mas como? Melzinha simplesmente te contou ou...? – Quis saber ainda mais a outra. Estava querendo detalhes, é claro. Estava incrivelmente falante depois que soube das novas. O mau humor dos últimos dias tinha simplesmente sumido como fumaça no ar!

- Olha! Sr. Alves está aqui. – Exclamou a negra na tentativa de distrair a outra anunciando a chegada do 4º período.

- Sabe, eu acho que deveríamos ter mais dever de casa... – Jacky disse em voz alta enquanto o professor de química passava pelas primeiras carteiras das filas onde ela e Bianca estavam sentadas lado a lado.

- E provas mais difíceis. – Completou a outra caprichando no sorriso deslumbrante que possuía. O professor sorriu satisfeito ao ouvir “acidentalmente” esse diálogo alto das duas. “Que alunas aplicadas”, pensou. Então sentou-se à mesa dos mestres.

- Ele é tão gato. – Jacky afirmou depois que ele já havia saído da zona de audição.

- Nem me fale! – Esganiçou Bianca animadamente.

~ Ѽ ~

- Então... Sobre o que quer falar? – Rafael perguntou distraidamente enquanto diminuía a distância entre os dois.

- Quero esclarecer as coisas. – Ele respondeu na mesma calma.

- Está tudo bem claro para mim. – Disse antes de tirar o canivete do bolso e apontá-lo contra o ex-melhor amigo.

- Rafa, o que está fazendo? – Kadu perguntou, amedrontado e surpreso, enquanto dava alguns passos para trás.

- Você ainda tem dúvidas? – Sorriu discretamente e avançou.

Kadu olhou para os lados, apesar do porte atlético, não era bom em brigas e, mesmo se fosse, Rafa era bem mais musculoso. Estava pensando em uma saída estratégica quando foi atingido pó um golpe nas costas. O soco dado por Rafa foi o bastante para deixa-lo sem ar por alguns segundos. Ofegou por um tempo, não teria como fugir e Rafael estava fora de si. Resolveu, pela primeira vez na vida, enfrentar o problema.

Segurou o braço esquerdo do outro tentando deter o canivete apontado contra seu peito, empurrou Rafa com as pernas. Ele desequilibrou e caiu no chão da quadra. Kadu aproveitou esse ligeiro tempo em que Rafael lutava para ficar de pé para tentar tirar o objeto pontudo que segurava na mão esquerda. Assim que se aproximou, ele reagiu dando-lhe uma rasteira violenta que o fez cair de costas no chão frio, imobilizou suas pernas pressionando os joelhos sobre os joelhos dele e prendendo o braço esquerdo com sua enorme mão direita. Não tinha como escapar. Fechou os olhos e suplicou engasgando:

- Eu não fiz, Rafa, é mentira eu juro. Eu juro, não fiz isso. – Foi dizendo, desesperado, na maior velocidade que podia. – É mentira, juro por tudo, qualquer coisa, a minha vida.

- Você não pode jurar por algo que vai perder.

Dito isso, Rafa não quis nem mais ouvir, estava cego pela traição e tinha certeza do fato, o outro estava negando somente porque era um covarde. Avançou o canivete em direção ao peito do ex-melhor amigo quando sentiu o baque do golpe que recebera na cabeça. Isso o fez sair de cima de Kadu da mesma forma que a arma escorregou da mão.No chão, vislumbrou o rosto de Daniel, a raiva o fez esquecer que era hora do treino de basquete, Daniel fora o primeiro a chegar.

Refletiu, rapidamente, que isso significava que teria pouco tempo para fazer o que tinha planejado antes que os outros chegassem.

- Rafa você enlouqueceu, cara? Tá maluco? – Daniel gritou surpreso com a briga dos dois, antes melhores amigos. – Vocês são amigos, cara, é só uma garota! – Exclamou enquanto ajudava Kadu, já todo esfolado, a levantar-se. Rafa aproveitou para recuperar o canivete.

- Não é só uma garota! – Respondeu, firmemente, antes de avançar de novo. Viera para machucar Kadu, mas se o outro fazia questão de impedir-lhe, assinara a lista também.

Daniel colocou-se em posição defensiva e tentou segurar o braço esquerdo do Rafael para impedir que a arma pontuda ferisse alguém. Rafa lhe devolveu com uma cotovelada no estômago que o fez ajoelhar-se no chão. Kadu tentou um golpe por trás, mas o outro se defendeu com um chute tão forte que caiu novamente. Rafael pisou-lhe o estômago, desta vez, só para fazê-lo gritar de dor. Chegara a hora. Investiu o canivete contra o pescoço dele , mas foi, mais uma vez, interrompido por Daniel que segurava, com as duas mãos, o braço com que estava armado. Rafa fez a força contrária e cravou a lâmina afiada no japonês que urrou de dor ao sentir o golpe. Deitou-se no chão em meio ao sangue que jorrava do antebraço onde o canivete ainda estava enterrado. Rafael ficou horrorizado com a cena, acabara descontando a fúria em um amigo que não tinha culpa alguma nessa história. Chegou mais perto, a fim de ajudar, mas Kadu pôs-se na frente, pensando que ele queria terminar o serviço.

- Vai embora, desgraçado! Some, Rafael! – Gritou com toda a raiva que poderia. Se Rafael preferia acreditar na mentira e machucá-lo pra valer já era uma prova da falta de caráter, mas ferir um amigo inocente era passar dos limites. Estava tão raivoso que pensou em espancá-lo até a morte, agora que era um covardão desarmado, mas quando iria avançar, escutou passos. O resto do time estava chegando, pelo visto, Rafael também os ouviu pois, rapidamente, pulou a grade do lado oposto da quadra e sumiu.

- O que aconteceu aqui? – Perguntou o treinador, seriamente, com o humor já alterado percebendo Daniel sangrando no chão. Ele gemeu de dor em resposta. – Carlos Eduardo, você está encrencado. Diretoria, agora!

- Mas eu não fiz isso! Não o machuquei, foi o Rafael! – O time todo encarava os dois com o mesmo ar de surpresa. Certamente, não sabiam o que estava acontecendo ali, mas seja o que fosse, não era bom.

- O Rafael nem ao menos compareceu às aulas hoje, está com falta na portaria. Não invente, Eduardo! – Ordenou com toda a rigidez e impaciência possível. “Isso é o que se ganha por trabalhar com esses moleques”, pensou o treinador.

- Ele... ele tá certo! – Daniel custou a dizer. – Rafael me esfaqueou... – Falou lentamente olhando para o teto, visto que a dor chegava a cegar-lhe.

- Sim, senhor! Rafael estava aqui, nos esperou chegar e nos atacou! – Kadu confirmou aliviado o que o amigo dissera. Só faltava essa, além de fura-olho virar o psicopata do colégio atacando os colegas do basquete.

- Leonardo, Samuel, ajudem-no a chegar até a enfermaria, o antebraço está sangrando demais, ele está perdendo muito sangue. Depressa. – Um careca bastante alto e o cabeludo ao seu lado começaram a se mexer em direção ao colega caído. – Eduardo, você vem comigo até a diretoria.

- Mas eu já expliquei que não fiz nada!

- Não interessa. Você foi testemunha do ataque a um aluno dentro da instituição e, pior, contra o filho do diretor! Ele vai querer achar o culpado...

- Eu já disse que foi o Rafael, droga! Será que ninguém acredita em mim?

- Rafael enlouqueceu? É o cestinha do time, por que diabos atacou um companheiro? – O técnico bradou em bom som e ouviu-se o eco pela quadra.

- Eu tenho um palpite! – Gritou um jovem alto, moreno e cabeludo em tom de zombaria. Os outros todos, com exceção do treinador, Kadu e Daniel, riram.

- Aposto 50 que a Mel está nessa! – Gritou outro jovem, mais baixo e descorado, ao lado dele. Ouviram-se outras risadas. Daniel já havia desaparecido de vista, amparado pelos companheiros que o estavam ajudando a chegar à enfermaria.

- 100 que o filho do Kadu também foi motivo desse ataque! – Outro garoto atreveu-se a berrar aos demais que tentaram segurar o riso em vão. Incrível como a fofoca corre rápido naquele colégio, bastou Bianca mencionar isso no intervalo que o rosto de Kadu já estava impresso na primeira página do jornal das más línguas. Cansou disso, saiu da quadra em direção à diretoria.

~ Ѽ ~

Ouviram-se passos no corredor cor de creme do 1º andar, o salto agulha arranhava a cera passada no chão logo cedo. A mulher de imensos cabelos louros e cacheados bateu na porta onde estava incrustada uma placa com os dizeres “diretoria”.

- Quem é? – O diretor perguntou, estressado já de manhã. Era, provavelmente, algum aluno fresco vindo reclamar sobre algum chiclete que grudaram em sua mochila.

- Vim trazer os relatórios que o senhor pediu. – Respondeu, educadamente, a mulher esbelta que carregava uma pequena pasta cor de amora.

- Ah, claro. Entre, Srta Montez. – O diretor, descendente de japoneses e bastante alto, aproximou-se da porta para receber a professora.

- Obrigada. – Disse ela baixinho antes de jogar a pasta e as folhas voarem pelo chão da sala.

O diretor beijou-lhe os lábios enquanto trancava a porta. Passou as mãos pelas costas da mulher bastante bonita, enquanto desabotoava seu sutiã e acariciava seus seios. Ofegante, ela disse:

- Não temos tempo... Faltam 8 minutos para começar o 4º horário... – Ela disse, mas não foi ouvida. Ele deitou-a sobre a mesa, derrubando um globo terrestre miniatura, um porta lápis e um bocado de pastas no piso. Beijou-lhe o pescoço com fervor e voracidade.

- Bom... O que quer fazer nos 5 minutos restantes? – Ela ouviu, sorriu.

Mordeu os lábios dele e sugou-os enquanto tentava tirar a saia social marrom bombom. Ele ajudou-a a retirar a peça e passou as mãos por dentro de sua calcinha de renda, ela suspirou e gemeu. O telefone tocou.

- Droga! – Sussurrou Nakaíme. – Vou ter que atender, a secretária pode resolver vir aqui caso eu não responda.

- Rápido. – Beatrice respondeu ofegante antes de apoiar a cabeça na mesa da diretoria.

- Sim, Odete? – Ouviu-se a voz feminina da secretária do outro lado da linha. – Não, diga que agora estou ocupado, peça para ligar mais tarde. – Odete respondeu, impacientemente, com ruídos que só o diretor pôde entender. – Tudo bem, repasse a ligação. – Respondeu ele contrariado e sentou-se ao lado da loira, ainda deitada seminua sobre sua mesa. – Como vai, doutor Adamatti? – Forçou um tom amigável como se ele não tivesse interrompido uma interação íntima prestes a ocorrer. - Sim, a Srta. Odete me informou que o Alex faltou à aula hoje. – Houve uma grande pausa. Beatrice pôde ouvir o político falando duramente do outro lado da linha, provavelmente, dando um sermão no colégio que não avisara a ausência do filho. – Sim, sim, o doutor tem razão. – Ichiro Nakaíme disse, eventualmente, entre textos enormes vindos do outro lado da linha. Sua face estava muito entediada, mas fingia grande interesse toda vez que concordava. Passou a mão por cima das coxas da professora e foi subindo até alcançar a calcinha branca, ela arregalou ligeiramente os olhos com a surpresa.

O diretor segurava o telefone com uma mão e, com a outra, esfregava os dedos na calcinha da loira, ela fechou os olhos com a sensação. Depois de afirmar, mais uma vez, o quanto Adamatti pai estava correto, afastou a aba da calcinha e esfregou os dedos com mais intensidade no sexo da professora Mendez. Ela gritou de prazer.

- O que foi isso? – Adamatti, irritado, interrompeu o sermão quando ouviu o grito.

- Hum, nada. Acho que a Odete tropeçou em uma de suas samambaias de novo, prossiga. – Ouviu-se a continuação das palavras do outro lado da linha. Ichiro colocou o dedo indicador sobre os lábios, sinalizando silêncio. Então, voltou a acariciar intimamente a Srta Mendez. Ela apertava os olhos, contorcia o rosto e respirava ruidosamente, na tentativa de não atrapalhar novamente a conversa. Quando ele aumentou a intensidade, teve que cobrir a boca com as duas mãos para evitar que escapasse um gemido sequer. – Tudo bem, vou ser mais ágil e freqüente na tarefa, doutor. – E aumentou ainda mais a agilidade dos dedos. – Assim está bom para você? – Beatrice balançou a cabeça positivamente enquanto mais palavras eram ditas por Adamatti. – Ótimo, irei providenciar tudo isso, um bom dia. – E assim que desligou o telefone, agarrou os cabelos da professora, enquanto despia as próprias calças.

- O sinal já tocou faz tempo... Temos que parar. - Disse ela entre os suspiros, tentando raciocinar.
- Paramos se você quiser. – Disse ele, chupando seu pescoço. Ela agarrou o cinto preto das calças dele e retirou-o com violência, pouco antes de escutar batidas na porta.

- Inferno! – Resmungou baixinho Ichiro enquanto apressava-se a se vestir de acordo com a sua função de diretor na instituição.

- É o Crosara! - Beatrice pôs se de pé com o susto, pegou o sutiã, a saia e a blusa que estavam jogados pelo chão e começou a vestir-se também.

– Como sabe? Ah... Não vai dar tempo! – Ele sussurrou. – Ela embolou as roupas na mão, correu para o banheiro da sala e encostou a porta.

- Diretor Nakaíme?

- Sim? – O diretor deu uma última ajeitada e destrancou a porta, encarou Kadu. – O que deseja?

- O treinador me mandou vir... Posso, talvez... entrar? – Perguntou desconfiado com essa atitude.

- Claro, entre. – Afastou-se da porta para que o jovem alguns centímetros maior entrasse. Kadu encarou a sala, percebeu o tapete desordenado e os objetos caídos próximos à mesa. Entendendo o que o garoto estava olhando, disse: - E Odete ainda diz que vem aqui para limpar! Essas secretárias de hoje... São contratadas para arrumar e acabam bagunçando! – Riu.

- Ah... – Respondeu ele enquanto sentava em uma poltrona em frente ao brasão do colégio.

- Então, como posso ajudá-lo, Carlos Eduardo?

- Bem, eu vim explicar a história do que houve com o Daniel, olha eu não tive culpa, quem deve se ferrar mesmo é o Raf...

- O que tem meu filho? – Interrompeu o diretor, preocupado.

- Rafael o atacou! – Beatrice, ao ouvir isso, resmungou um palavrão que foi ouvido apenas pelas paredes do banheiro da sala do diretor.

- Como assim? – Ichiro levantou-se bruscamente. – Onde ele está?

- Na enfermaria, calma, não foi nada muito grave. Foi só o imbecil do Rafael que deu a louca e começou a distribuir facadas.

- E não tinha ninguém lá vendo isso? Ninguém fez nada?

- Não, só estávamos eu e Rafael na quadra, então o Daniel chegou, tentou me defender, mas aí o Rafael ficou mais furioso e retomou o canivete, me derrubou no chão e enterrou a droga da arma no braço do japa... – Foi contando toda a história, rapidamente, sem parar para respirar. Omitiu a história com a Mel, já estava ruim o bastante com todos os alunos sabendo, isso não precisaria se espalhar, também, pelo corpo docente. O diretor ouviu tudo com calma e, ao mesmo tempo, com preocupação.

- Tem certeza de que não é grave? Acho que precisamos chamar uma ambulância!

- Vai saber... À essa hora a enfermeira já deu um jeito no braço dele, sei lá.

- Quero que me acompanhe até lá, ele precisa confirmar a sua história.

- Ok, vamos? – Kadu levantou-se rapidamente da poltrona, querendo resolver isso o mais rápido possível.

- Hum... Vá andando na frente, vá chamar o treinador também para que, caso eu preste queixa na delegacia, ele descreva o tipo psicológico desse delinqüente.

- Ah... Tudo bem. Vou indo... – Apressou-se a sair da sala e sumiu no corredor cor de creme. Logo que isso aconteceu, Beatrice saiu do banheiro, bastante assustada.

- Você não vai prestar queixa, vai?

- Claro! Não vou deixar que um aluno quase mate meu filho à facadas dentro do colégio o qual dirijo! – Disse em tom alterado, mas logo baixou a voz pensando que Odete, na sala ao lado, poderia ouvir seu diálogo “supostamente” sozinho.

- Não faça isso, por favor. Te peço, por favor. Abafe o caso, invente alguma coisa, sei lá, você pode... – Ela começou a suplicar rapidamente, mas sem perder a elegância.

- Por que raios no inferno eu faria isso? – Perguntou mais irritado ainda por lhe pedirem tal favor.

- Estamos falando do meu Rafael, meu filho!

~ Ѽ ~

- Tem certeza de que está bem? Assim que os jogadores espalharam esse caso pelo colégio, eu vim correndo te ver, bebê. Onde dói, amor?

- Fica calma, Bibi... – Respondeu ele com a voz cheia de bajulação. – Já me deram um remédio para a dor, já extraíram a droga do canivete e já fizeram um curativo... Eu estou bem. – Sorriu e encostou nas bochechas dela.

- Estou com ódio mortal daquele Rafael, você não tinha nada a ver coma história daquela suburbana e acabou pagando o pato. – Bianca fechou as mãos com força por causa da raiva que estava sentindo. Estava ali, na enfermaria do colégio, encarando o namorado com um curativo enorme no braço por causa de um chifrudo esquentadinho e uma vaca grávida. Que ódio.

- Na verdade, ele estava tentando matar o Kadu, eu tive que ajudar...

- Por que infernos não deixou o Kadu se ferrar? Você não tinha nada a ver com esses... – Escutou a porta se abrindo. O diretor estava entrando no quarto seguido por Kadu e o treinador do time. Parou de falar.

- Bom dia. – Disse a enfermeira, por trás de uma parede de vidro. – Ah! Senhor diretor! – Adocicou muito mais o tom assim que viu o japonês no cômodo. – Eu estava aqui a pegar os relatórios do incidente com a gracinha do seu filho! – Sorriu de orelha a orelha, Daniel fez uma cara de nojo. – Acredito que vão precisar quando levá-lo ao hospital.

- Bom dia... – Virou-se para o filho. – Como você está?

- Bem melhor, pai. Oi Kadu, – acenou a cabeça – treinador.

- Não se preocupe Daniel, vou tirar o Rafael do time, isso não vai ficar assim... – O treinador começou a derramar palavras de justificativas. Estava muito claro que sentia um pesar enorme por ter que tirar o cestinha do time e sacrificar o campeonato, mas não poderia deixar que seu trabalho fosse colocado em cheque, assim, tão facilmente. O garoto não respondeu, não queria que nada disso estivesse acontecendo.

- Como está o braço, cara?

- Nem dói mais, mano. – Respondeu a Kadu, não querendo parecer um bebê chorão.

- Claro que não! Depois de um choro e cinco analgésicos, nem poderia! – A enfermeira gargalhou e sorriu, querendo mostrar o bom serviço que desempenhara. Daniel fechou cara para ela.

- Norma, você disse... hospital? – Perguntou Ichiro, bastante preocupado.

- Sim, sim! Temos uma enfermaria e enfermeiras, claro, muito especializadas e prestes a desenvolver as necessidades de todos os alunos dessa digníssima instituição. – O diretor levantou as sobrancelhas, não queria ouvir esse discurso babado. – Porém, não temos a condição de satisfazer necessidades mais graves, como foi a do seu filho, eu retirei a arma com cuidado para não danificar ainda mais os tecidos e vasos, dei-lhe um remédio para a dor, um antiinflamatório e fiz um curativo básico, mas creio que, em um hospital, teriam mais recursos para examinar e tratar o acidente. E, também, é preciso um médico para receitar os remédios para esse tipo de ferimento.

- Então vamos a um hospital agora mesmo.

- E o Rafael? – Perguntou Kadu para o líder do colégio.

- O que tem ele?

- Como vai ser punido? Vai ser expulso?

- Tudo ao seu devido tempo, Sr Crosara. – Kadu não gostou da resposta.

- Eu vou com você até o hospital, amor! – Bianca se impôs.

- Não acho que será necessário, Srta Bittencourt.

- E por quê? – Ela perguntou, ameaçadora.

- Deixa ela vir, pai... Bom que me faz companhia...

- Então vamos logo. – Viu que não teria como discutir, acenou para a enfermeira, que estava toda sorridente e dirigiu-se para a porta. Bianca ajudou o namorado a se levantar, pegou na sua outra mão e auxiliou, também, ao descer as escadas. No hall de entrada, ela, Daniel e o pai, se despediram de Kadu e o treinador que iriam fazer uma busca no colégio para encontrar o amigo culpado por isso, Rafael. Vários alunos cochichavam e conversavam nas escadas e em frente à porta principal do colégio, o sinal da saída já havia tocado. O diretor pediu que eles esperassem na calçada para que fosse até o estacionamento buscar o carro que iria conduzi-los ao hospital. Foi então que Bianca o viu.

Rafael estava ali, no estreito beco entre o colégio e o prédio ao lado, encostado na parede, olhando para o chão. Certamente estava esperando que Daniel saísse para poder verificar o tamanho do estrago que causara. Bianca o encarou, as mãos tremeram, mas Daniel não o viu, estava absorto nos próprios pensamentos. Quando olhou em direção à rua, percebeu que tinha sido encontrado, mas o tempo foi insuficiente para sair dali, ela já estava caminhando firmemente em sua direção, com a mesma cara de um Pit Bull em seus piores dias. Daniel ainda estava lá, de costas pra eles e parado a alguns metros de distância, visualizando o movimento dos carros.

Bianca cerrou ainda mais as sobrancelhas ao chegar mais perto do agressor do seu “bebê”, Rafael, assustado, arregalou os olhos, ela estava irada. Apressou os passos firmes e, assim que o encontrou, deu-lhe um tabefe no rosto.

- Imbecil! Se você encostar os dedos em um de nós de novo, juro que chamo meu pai pra te prender, ô moleque! – Gritou com toda a raiva que podia, sempre achou que esse Rafael era o maior espancador, bem que tentou abrir os olhos de Jaqueline!

- O que pensa que tá fazendo, sua louca varrida? – Ele urrou enchendo-se de raiva novamente, nunca tinha levado tapa de mulher e estava realmente preocupado com o amigo.

- Estou defendendo o que é meu, ignorante. E não grita comigo, seu sem educação, não sou mulher de caminhoneiro, desse tipo da Mellanie, que aceita esses seus desacatos de bêbado! – Ele ficara ainda mais furioso ao ver que ela havia tocado no nome daquela cujo nome não queria ouvir nunca mais.

- Olha aqui garota, nunca te passou pela cabeça que você é uma puta de uma intrometida? Você não toma semancol não? Nada disso é assunto seu, diabos! Por que fica espalhando isso toda hora, o tempo todo, metendo esse seu narigão onde ninguém te chama? Você não tem vida própria pra cuidar não ou é uma pobretona fofoqueira de boutique mesmo? – Ela ficou boquiaberta e apontou-lhe o dedo indicador.

- Boutique? Boutique é onde a sua adorada Mel vai parar, lavando o lavabo, claro, pra pagar as contas do seu catarrento que carrega na barriga! – Gritou como nunca tinha gritado com alguém antes.

- Meu catarrento? Desgraçada, não adianta fingir que não sabe de toda a história, que não sabe que é do Kadu, porque foi você que espalhou.

- Está vendo como você é um jegue? Um João ninguém? Você é um derrotado, Rafael, acreditou na primeira mentirinha que te contaram, infeliz. Você acha mesmo que alguém, além de um desclassificado como você, iria querer aquele projeto de gente que se chama Mellanie? A cria é sua e eu tenho profunda pena dela. – Sentiu as veias dos olhos latejarem com a ira que estava sentindo dentro de si e, nos mesmos passos firmes com que tinha o encontrado, ela saiu em direção à calçada, mas não viu Daniel que, provavelmente, não sabia onde ela tinha ido e já teria sido levado ao hospital pelo pai. Deu as costas e chamou um taxi, deixando Rafael na completa escuridão.

~ Ѽ ~

Ѽ Capítulo 7: Vínculos rompidos  

Posted by: Venenosa

- Ai meu Deus, Mel! – Vicky gritou, tentando se soltar das amarras da maca em que estava sendo colocada para poder prestar atenção na melhor amiga que se encontrava desmaiada a poucos passos de si. Alex correu em direção à garota caída no chão e a segurou no colo, enquanto os paramédicos olhavam assustados não entendendo muita coisa.

- Vocês disseram que o chamado era para uma só pessoa. – Disse um deles, enquanto pegava um estetoscópio na maleta e avaliava os batimentos de Mel.

- E era! – Vicky gritou mais ainda, histérica, imaginando a falta de sorte de tudo isso acontecer justo no dia da sua festa do biquíni.

- Vamos colocá-la na maca reserva. – Sugeriu outro paramédico para aquele que parecia o chefe e estava dando leves tapinhas na face da Mellanie a fim de reanimá-la.

- Sim, temos que examiná-la. Pode ser grave. – Então olhou para Alex. – Ela reclamou de alguma dor? Estava sentindo algo diferente? Costumam existir sintomas antes de um desmaio.

- Não, - deu de ombros - comigo ela não comentou nada, mas eu percebi, pela aparência doente dela, que não estava nada bem.

- Ela me disse que tinha vomitado ontem! – Vicky gritou novamente, já dentro da ambulância e fora das vistas dos dois. – Disse que era intoxicação alimentar!

- Intoxicação alimentar não provoca desmaio, a não ser que seja algo muito grave. Bem, vamos ter que dar uma olhada. Coloque-a com cuidado ali, por favor. – E apontou uma das macas vazias que agora já tinha sido trazida para a rua.

~ Ѽ ~

- Ei! O que está acontecendo lá fora? – Gritou um dos homens altos no jardim dos fundos, que juntava os CD’s para poder se retirar.

- Não sei, me disseram que a Vicky passou mal e por isso teve que cancelar tudo. – Respondeu outro, mais alto ainda e careca, espichando o pescoço por cima da cerca viva para espiar um pequeno aglomerado de pessoas vestidas de branco na frente do jardim principal da mansão.

- O que aquele idiota está fazendo com a minha namorada de novo? – Kadu berrou, ajudando a afundar ainda mais o astral da festa que já tinha ido por água abaixo. Pôs se de pé e atravessou a porta de vidro do hall, buscando uma maneira de chegar até a ambulância no outro jardim.

- Quem é que vai me ajudar a recolher os espetos? – Gritou uma menina baixinha e magrela, vestida em um biquíni amarelo ouro. Parecia muito brava e ordeira.

- Eu vou, Érika! – Respondeu, prontamente, um dos jogadores do time, que puxou um dos espetos perto da beirada da piscina sem perceber que este estava dentro de um vaso de porcelana, que despedaçou em mil pedaços.
- Sua mula. – Disse a menina, nem um pouco surpresa com a falta de coordenação motora do garoto.

- Acho que já recolhemos tudo. – Constatou Léo, o careca alto do time, vinte minutos depois. – Vamos levar lá pra fora e colocar no carro. Quem vai comigo, já pode ir se mexendo, galera!

- Deixa que eu levo isso. – Disse Rafa, pegando uma das caixas de bebida que eles haviam trazido e levando-a até o conversível preto, carro do pivô do time. A ambulância, que antes estava parada próximo daquele local, não estava lá mais. Avistou Daniel ajudando a carregar as coisas, estava com uma garrafa de vodca na mão, apenas. “Preguiçoso”, pensou. – Hey Dan! – Percebeu Daniel girar a cabeça para encará-lo. – Vai de carona com o Léo?

- Vou! – Disse sorrindo enquanto se aproximava de Rafa. – Ele disse que vamos fazer uma pequena parada antes de ir para casa. – Sorriu maliciosamente.

- Aonde vamos? – Perguntou o outro, confuso. Outras pessoas começaram a sair da casa, ajudando a limpar a bagunça ou, pelo menos, a sumir com ela.

- Ele disse que vamos à casa de umas amigas, sabe como é! – Riu alto, estava consideravelmente bêbado.

- Não gostei dessa história! – Sorriu a garota de pele negra como a noite e brilhante como a Lua.

- Bibi! – Festejou Daniel ao vê-la. Correu, aos tropeços, para abraçá-la e beijou-lhe os lábios. – Não sabia que o meu amor iria aparecer aqui! – E tentou disfarçar o papo antigo.

- Olá Bianca. – Cumprimentou Rafa, já colocando a caixa no porta-malas do conversível parado ao seu lado. – O que está fazendo aqui à essa hora? Já está um pouco tarde para aparecer... Quase meia noite...

- Olá... Não, eu não fui convidada. – Sorriu amarelo para tentar demonstrar que não ligava a mínima para esse fato. – Eu estava – pausou – passando, pelas redondezas. Estava na casa da Jacky – e Rafa estremeceu ao ouvir esse nome -, queria ir embora e vim ver se poderia ir com um de vocês. – Alargou o sorriso. – Mas, espere, não achei que a festa da Vitória terminaria tão cedo... – Sibilou.

- Ah, parece que ela não estava passando bem, amor. – Respondeu Dan, beijando-lhe o pescoço. – Que bom que você apareceu...

- É mesmo? – Disse, parecendo confusa. – O que ela teve?

- Não sabemos. – Respondeu Rafael, secamente. A menção do nome de Jacky arruinara toda a sua noite. Juntado ao fato de que não conseguira ficar sozinho com Mellanie nem por quinze minutos para lhe contar, para se declarar... Seu humor estava péssimo. – Algo aconteceu com ela e com a Mellanie.

- Foi, a empregada só nos disse pra ir embora e pronto, amor. Nem nos explicou nem nada. – Daniel acrescentou, ainda lhe acariciando o rosto.

- Esperem... A Mel também passou mal? – Perguntou, desta vez, verdadeiramente confusa. Ela sabia que Vicky iria ceder à gula e comer os bombons alemães de damasco que ela, Jacky e Mandy lhe enviaram e acabaria com toda a festa, mas Mellanie? Seria ela também alérgica a damasco? Não era uma alergia muito comum, que coisa mais estranha...

- Sim. Saíram agora à pouco em uma ambulância. – Respondeu Rafa, percebendo que os beijos de Daniel estavam ficando mais fogosos, talvez por causa da falta de senso da bebedeira, e já querendo sair dali. Bianca resolveu aproveitar-se ainda mais da situação.

- Bom, que pena. Espero que fique tudo bem com o bebê. – Rafael, que já estava ensaiando uma saída despercebida, congelou no lugar, como se estivesse com os pés colados ao chão.

- Que bebê, amor? – Daniel desgrudou a língua da pele dela. Estranho como essa palavra assusta qualquer homem.

- Melzinha está grávida, não sabiam? – Perguntou, tentando simular uma face confusa, mas lutando para esconder um sorriso triunfante que insistia em não querer ir embora.

Rafael deixou o queixo cair, definitivamente não estava esperando por isso. Não, nem ao menos sonhava com tal fato. Quando poderia imaginar? Um suor frio derramava pelo seu rosto, molhando os cabelos louros e pingando sobre as maçãs da face avermelhadas. Seus sentimentos misturavam angústia e raiva. A angústia acompanhava o pensamento de que era muito jovem para ser pai. E sempre disse que amaria Mellanie pela vida toda, mas agora que “pela vida toda” tornava-se algo irremediável e sem volta, não tinha mais tanta certeza. Era uma responsabilidade maior do que poderia agüentar. E a raiva queimava quando refletia que Mellanie não quis lhe contar sobre isso, não tivera confiança para lhe dizer. Aparentemente, já contara ao colégio todo, já que sabia que ela e Bianca não eram amigas e, se ela sabia, era porque Mellanie já dissera para todos, exceto para ele. Ficou sem saber o que dizer, mas teria que descobrir até onde Bianca saberia. Talvez não passasse de boato, resolveu disfarçar e fazer a pergunta mais básica.

- Quem é o pai? – Gaguejou.

- O Kadu. – Disse, confiante, piscando os olhos cor de amêndoa.

Rafa riu alto, incrédulo. Agora tinha certeza de que essa história não passava de boato. Bianca tinha inventado tudo, não poderia ser verdade, não poderia.

- Kadu? Meu melhor amigo? - Riu novamente. Daniel, cambaleando, acompanhou a risada, mas Bianca manteve a face séria, cheia de desdém.

- Sim, o próprio. Não foi surpresa para ninguém, na verdade... Todos sabiam que o namoro dele com a Vicky já era. – Sorriu.

Rafa passou a mão pelos cabelos, preocupado. Pela primeira vez, parou de sorrir. O que ela acabara de dizer era completamente verdade. Há tempos que Kadu diz que o namoro com Vitória já estava nas últimas e que precisava de outra. O suor frio voltou a aparecer e ele, até mesmo, teve a impressão de sentir o chão se mover. Flashes começaram a aparecer na sua cabeça. Lembrou-se do último treino de basquete onde Kadu tentou convencer-lhe a não se declarar apara Mellanie, a esquecê-la. “Vai nessa que ela vai te perdoar assim tão fácil. Esquece a Mel, cara, tô te falando.”, as palavras de Kadu foram nítidas em sua cabeça. Rafa lembrou-se de outro trecho da conversa: “Bianca é a maior fofoqueira, mano! Se bem que dizem que tudo o que ela espalha é sempre verdade...”
O ódio começou a ferver em suas veias. Não estava nem enxergando a face triunfante de Bianca. Daniel estava tão bêbado que nem percebeu o mal estar do amigo e continuou a beijá-la.

Rafael andou alguns passos pela calçada, olhou para os lados. Não viu Kadu. Provavelmente, foi junto com a ambulância. “Onde Mel também está...” um capetinha com a própria face sibilou em sua cabeça. A raiva tomava cada parte do seu corpo, seus braços chegavam a formigar. A pele queimava em chamas vivas de ódio. Cenas de morte passaram pela mente, desejou ter uma faca, uma tesoura, um revólver, qualquer coisa, da próxima vez que encontrasse com Kadu.

~ Ѽ ~

- Como pude deixar isso acontecer? - Gemeu Vicky enquanto espremia o seu rosto, ainda inchado contra o travesseiro. - Aquela ordinária ainda vai me pagar! - Continuava a reclamar enquanto se ajeitava melhor na cama do seu quarto, puxando os lençóis azulados até a cabeça, embora não tivesse mais ninguém no quarto o desejo de se esconder ainda continuava forte.
Seus cabelos claros e lisos estavam completamente bagunçados, sua face, apesar de ainda não ter retomado a impecável aparência original, estava bem menos avermelhada. Percebeu que estava tão aterrorizada com a própria desgraça que já não parava para pensar sobre a amiga que havia desmaiado no dia anterior.
Ah, com toda a certeza Mel entenderia. Afinal era o rosto de Vitória que estava passando por péssimos bocados, o que seria mais importante? De qualquer forma já havia se convencido de que Mellanie estava apenas com algum tipo de intoxicação e logo melhoraria, ao menos era no que a loira queria acreditar.

Havia faltado na escola, pois logo teria que se levantar, tomar coragem e ir até o hospital para que dessem uma outra olhada na alergia que fizera sua garganta inchar ao ponto de quase não haver espaço para a passagem de ar na noite anterior. Mas como iria encarar o mundo com o rosto daquela maneira? É claro que não estava tão ruim como na noite anterior, mas as marcas ainda eram presentes na pele outrora lisa e macia.

Seus pensamentos foram interrompidos quando a porta do quarto foi aberta por um enorme buquê de flores cor-de-rosa. Vitória teve que piscar duas vezes antes de perceber que a empregada estava escondida atrás do arranjo floral.

- Senhorita Medeiros? Desculpe-me interrompê-la, mas esse buquê chegou mais cedo e não quis acordá-la... – Disse, desajeitada, enquanto depositava as flores na cama ampla. Vicky deu um gritinho animado.

- Não acredito que Kadu me mandou as rosas! E, cor-de-rosa, minha cor favorita! – Levantou-se animada até esquecendo-se, temporariamente, das marcas de alergia. – Não é lindo, Fátima? Não é lindo quando o romantismo não se perde em uma relação mesmo com o passar do tempo? – Perguntou, enquanto esticava o braço para alcançar o cartão preso por uma fita branca ao caule de uma das flores.

Em uma caligrafia fina e tinta preta estavam escritas somente 5 palavras:

“Espero que esteja melhor,
Alex”

Vitória piscou os olhos novamente, incrédula. Não sabia exatamente se estava louca da vida, feliz ou frustrada. Como o Kadu pôde fazer isso? Não a acompanhou até o hospital ontem, não ligou para saber notícias e nem sequer mandou um cartão! Estava cansada do descaso dele com a relação amorosa que construíram ao longo de alguns anos. “A verdade é essa, Vi, ele não liga pra você”, constatou uma voz em sua cabeça. As flores do Alex, contudo, eram lindas! E ele, apesar de frio e fechado, esteve com ela praticamente a noite de ontem inteira (contra a vontade dela, claro, que não queria ser vista com o rosto naquele estado), mas mesmo assim, foi uma atitude fofa... Isso a alegrou um pouco. Mas, qual é! “Espero que esteja melhor”? Será que não havia nada mais caloroso e agradável para escrever em um cartão?

- Algum problema, senhorita? – Fátima perguntou, desconcertada, diante do silêncio da patroa, que ainda segurava o cartão nas mãos.

- Não, não... – Ajeitou-se ela logo. – Traga-me o telefone, vou ligar para agradecer.

~ Ѽ ~

Alex escutou o toque tão familiar do próprio celular, franziu as sobrancelhas ao olhar o identificador de chamadas.

- O que você quer?

- Onde você está? – Perguntou a voz do pai, séria.

- Não é da sua conta.

- Até quando vai ficar nessa palhaçada de não dormir em casa? Você não pensa, Alex? Não tem dó da sua mãe? Ela está em frangalhos desde que você sumiu. – Aumentou o tom de voz. O filho realmente o tirava do sério.

- Ah, eu tenho certeza que ela já bebeu muito prosecco de tanta tristeza, não é? – Debochou. – O que você quer?
- Quero te avisar que recebi a visita de dois policiais hoje. Você tem idéia do quanto isso pode me atrapalhar? Se a imprensa vir a autoridade visitando a minha casa com freqüência, vão me arruinar! Achei que tinha conseguido enterrar esse caso, mas me parece que é bem mais sério do que eu imaginava.

- E você quer que eu faça o quê?

- Já que você não mora mais aqui, não tenho o dever de receber as suas encrencas que tocam a minha campainha, entendeu? Eles estão procurando por você, acho que querem ouvir de você o que houve aquele dia no penhasco. E acho bom você dar logo a sua versão antes que se torne um foragido, ouviu Alex? Acho bom mesmo, se você se tornar um foragido, não tenho certeza se ainda o quero como filho! Porque não segue o exemplo do seu irmão, meu Deus? – Alex desligou o telefone antes que o sermão começasse. É claro que sabia que era uma tremenda falta de educação, mas a sua família o deixava maluco. O telefone tocou de novo.

- O que você quer agora? – Perguntou, já nervoso, com o volume da voz alterado.

- Calma, só queria agradecer o presente... – Disse a loira, espantada com tamanha grosseria.

- Ah, oi... Vitória, desculpa, achei que era outra pessoa... Como está se sentindo?

- Estou bem, obrigada. Quero dizer, ainda tem marcas no meu rosto, mas a falta de ar passou. Onde você está?

- No hospital, ainda não liberaram a Mel. – Vitória assustou-se, como uma intoxicação alimentar poderia fazer com que Mel ficasse 12 horas num hospital?

- Como assim? Como ela está? – Perguntou, preocupada.

- Viva, ainda bem. Uma grave hemorragia intra-uterina, até onde sabem. O médico me disse que ela está sangrando por dentro, não tem certeza se é só o útero.

- O que? Como assim? Alex, eu não estou entendendo! – As mãos começaram a tremer, estava apavorada.

- Sim, parece que ela exagerou na pílula. Tomou quantidade maior do que deveria tomar... Pra idade dela, sabe? É bem novinha.

- Que pílula? – Vitória sacudiu a cabeça, tentando entender. Não sabia se era porque tinha acabado de acordar, mas não se lembrava de pílula nenhuma e certamente não sabia o porquê dessa hemorragia repentina.

- Pílulas do dia seguinte, Vick... Mel interrompeu uma possível gravidez.

Seu queixo caiu, não podia acreditar. Não era possível, Alex estava se confundindo. Não era verdade. Não mesmo.
- Oi Alex! Quanto tempo!

- Quem está aí? – A loira perguntou diante da voz feminina que ouvira do outro lado da linha. Alex virou-se.

- Ah! É a Milla! Vick, quando eu tiver mais notícias te ligo, tudo bem? Até depois. – Desligou o telefone antes que ela pudesse se despedir.

- O que está fazendo aqui, Alex? – Perguntou a garota de cabelos castanhos animada com o encontro inesperado.

- Estou... Hum... Acompanhando uma amiga.

- Ah... – Respondeu ela, percebendo que ele não queria comentar muito sobre o assunto.

- E você? Já te deram alta ou você ainda...

- Não, não! Já voltei pra casa! Vim pegar o resultado de um exame. – Levantou a mão esquerda mostrando um envelope.

- Mas... Está tudo bem? – Perguntou, preocupado.

- Sim, sim! Parece que foi só uma batidinha mesmo com a cabeça, nada de mais, sabe? – Alex suspirou de alívio ao ouvir isso.

- Que ótimo. Muito bom mesmo!

- Ei, escuta... Você já tomou café? Eu vim só pegar isso aqui mesmo, aí a gente podia, você sabe, comer alguma coisa...

- Não, eu não acho uma boa idéia, Milla, desculpa. – Foi impossível esconder a face da frustração ao receber essa resposta.

- Por que?

- Acho que a gente, bem, acho que não deveríamos mais andar juntos... – Ela arregalou os olhos, confusa. – ...por um tempo. – Acrescentou ele, cuidando para que ela não se sentisse ofendida.

- Aconteceu alguma coisa? Qual é o problema? – Perguntou, rapidamente, devido ao nervosismo.

- Então você não sabe?

- Não sei do quê? – Ela ficava mais confusa a cada instante.

- É que... Estão achando que você não caiu daquela pedra.

- Como não? Claro que caí! – Protestou com fervor.

- Acham que você foi jogada... – Ele olhou para baixo. – Que eu te joguei.

- O que? Que absurdo! Quem inventou isso? – Ela colocou a mão direita sobre a cabeça, apavorada. – Não é verdade! Foi um acidente! É por isso que me disseram que enquanto eu estava desacordada, um oficial veio me procurar!

- Certamente. Não sei quem inventou, Vick me disse que foi uma das garotas do colégio, bem, o boato ficou sério demais. – Respondeu ele, sério. – Então, acho que, até acertarmos essas coisas, deveríamos ficar afastados. Desculpa, Milla. Vejo você depois. – Ele a abandonou no meio do corredor e entrou em outro para poupar uma discussão maior. Se tivesse que cortar as relações com ela, que fosse rápido como quando se tira um band-aid, a demora aumenta a dor. É claro que não queria deixá-la, fora sua primeira amiga na escola nova e, mesmo a conhecendo por tão pouco tempo, já sentia um carinho enorme. Era uma amizade verdadeira, mas lembrou-se de uma frase do seu velho avô “A primeira virtude de um homem é o caráter” e depois acrescentou “Não sou um criminoso”.

Camilla sentiu-se um pouco tonta, não estava acreditando naquilo. Estava morrendo de medo no primeiro dia de aula, sabia que não iria se dar bem em um colégio de elite. Foi debochada no primeiro dia de aula e ele foi o único que a defendeu, mas e agora? Não tinha mais ninguém. Ele era o único com quem podia contar em uma selva onde só os fortes sobrevivem. E, não era só isso, estava começando a sentir um pouco de, como poderia explicar? Um sentimento que misturava admiração e necessidade. Seria amor? Em contraponto o ódio fez com que suas mãos tremessem, iria achar quem inventou esse boato. Iria achar a responsável pelo afastamento da única pessoa com quem se importava no mundo. E essa fofoqueira iria pagar.

~ Ѽ ~

Mandy passava, suavemente, a geléia de laranja na torrada, olhando, satisfeita, o seu farto café da manhã, haviam frutas, pães, leite e suco de abacaxi que serviam, não só de alimento, como também de decoração para a mesa, apesar do pouco apetite. O intervalo parecia, estranhamente, harmonioso e quieto. Talvez fosse a falta de alguns dos alunos, talvez fosse o bom sentimento de vitória na batalha da noite passada. Jacky ainda estava cabisbaixa, nem tocou na salada de frutas exóticas que encomendou do Egito. Bianca, por outro lado, estava animada e tagarela como sempre.

-Adoro geléia de laranja... me lembra damasco – Mandy sorriu levando a torrada até a boca, saboreando-a como jamais havia saboreado qualquer outra.

-Aposto que ela ainda deve estar vermelha como um pimentão! - Gargalhou Bianca enquanto bebia o suco de amora. Mandy somente outra vez.

- Só não entendi porque Mellanie e Alex faltaram também... O que seria isso? Solidariedade conjunta? – Soltou uma breve risadinha fina como a própria voz. Bianca riu também.

- Rafa também faltou. – Corrigiu Jacky entristecida, ainda olhando para baixo, brincando com a espátula de geléia entre os dedos. Mandy não respondeu. Não sabia o que dizer para a melhor amiga. Na verdade, ela não entendia porque Jacky estava daquele jeito. Estava praticamente um zumbi desde que Rafa terminou o namoro, não sabia mais como animá-la. Mandy duvidava a existência do amor, para ela, as pessoas somente ficavam juntas por conveniência, por egoísmo. Ficam com uma pessoa única e exclusivamente porque aquela pessoa faz bem a você mesmo, só.

- E então garotas, quem vai na minha festa no sábado? – Mandy perguntou com falsa animação para tentar embalar Jaqueline no espírito.

- Eu vou! – Respondeu Bianca de imediato. – Tem algum tema?

- Hum... Ainda não pensei muito nisso. – Respondeu rispidamente, tentando cortá-la. Mandy não considerava Bianca sua amiga, era somente uma garota influente no colégio que sempre estava a par de tudo o que acontecia. Era uma boa fonte de informações, mais nada. – E você, Jack?

- Não sei bem... Provavelmente você vai convidar todos, certo?

- Claro, vou fazer questão de que todos, inclusive as insuportáveis, vejam o meu prestígio. Depois de sábado, Vitória vai se envergonhar da festa que deu ontem.

- Mel e Rafa vão estar lá. Não quero ir. Ele pensa que eu não vejo os olhares que dá para aquelazinha. E, agora que terminamos, vai levar um piscar de olhos até que eles fiquem para lá e para cá de mãos dadas. – Essa era a coisa mais longa que ela disse em dias. “Deve estar melhorando”, Mandy pensou.

- Jack, já conversamos sobre isso. Você tem que deixar o Rafa pra lá. Sempre o achei muito tosco, sem contar mal educado, com aquela frieza toda. Ele terminou, acabou, pronto. Você é linda, pode arrumar um príncipe inglês se quiser.

- Você não entende! É muito fácil pra você falar pra eu esquecer o Rafa, não é você que dedicou meses da sua vida por ele, pra depois ser largada assim, do nada!

- Dedicou porque quis! Eu sempre te alertei sobre isso, sempre te falei que ele não retribuía com a mesma intensidade seus sentimentos! – Mandy esganiçou, com a voz fininha.

- Então agora está me chamando de idiota porque nem sempre sigo o que você diz? – Jacky retrucou, levantando o tom de voz.

- Não, estou dizendo o lendário “eu te avisei”! – Respondeu a outra, se defendendo.

- Mas como eu poderia saber, porcaria? A verdade é que começamos essa história por interesse dos nossos pais, mas eu me apaixonei!

- Agora sim estou te chamando de idiota!

- Como você ousa? – Jacky levantou-se da cadeira. As pessoas que estavam no recreio nem se incomodaram com a gritaria. Por incrível que pareça, mesmo o colégio sendo um local de alta classe, barracos faziam parte do cotidiano.

- Estou falando a verdade, se não pode aceitar, é problema seu. – Mandy levantou-se também. – E, aliás, tem muita coisa que você não consegue aceitar, não é Jacky? Como por exemplo, que seu namoro está terminado. Ouviu? Terminado!

- Acho que não sou eu que tenho problemas com a verdade aqui!

- O que quer dizer?

- “Ai, eu sou a Amanda, eu nunca me envolvi de verdade com ninguém e não acredito no amor porque meu papaizinho largou minha mamãe e eu para fugir com outra!” – Jacky fez falsete com a voz.

- Ordinária!

- Frígida!

- Mel engravidou. – Bianca disse, finalmente. Já tinha se divertido demais com aquela discussão e as pessoas estavam começando a olhar demais.

As duas arregalaram os olhos no mesmo instante, Mandy se sentou. Realmente não esperava por essa. Jacky continuou de pé, encarou Bianca.

- O que? – A voz estava trêmula. – Quem é o pai? – Estava com medo de fazer essa pergunta, talvez não tivesse forças para aceitar...

- Quem ERA o pai, você quis dizer. – Bianca corrigiu, em tom baixo, passando um pouco de geléia em uma torrada. Respondeu com tanta calma que parecia que estava respondendo a costumeira pergunta “será que hoje vai chover?”.

- Perdeu o filho, então? – Mandy quis se certificar de que tinha entendido corretamente.

- Abortou. – Respondeu a outra ainda sem nem olhar para as duas. – Quero dizer, não foi realmente um aborto, aborto... Ela tirou antes que o negócio crescesse. Pílulas do dia seguinte, digo. – Jacky finalmente se sentou.

- Você ainda não me respondeu. – Disse, tentando controlar o nervosismo.

- Kadu.

Sentiu vontade de sorrir pela primeira vez em dias. Tinha certeza que, depois dessa, seu namoro não estava tão acabado assim.

~ Ѽ ~
Vitória já estava pronta, tinha tomado banho, trocado de roupa e tentado disfarçar algumas manchas com corretivo facial, é claro. Iria ao hospital para se certificar de que ficaria tudo bem com a pele e aproveitara para ver Mellanie, mas antes, precisava confirmar os fatos. Pegou o celular e vasculhou a agenda na busca de um número que fosse confiável. Discou. Ela deveria atender, estava na hora do intervalo.

- Alô? Tânia?

- Oi? – Respondeu a garota do outro lado da linha. – Quem é?

- É a Vitória. Da festa, se lembra?

- Claro, claro! Desculpa não ter reconhecido a voz, é que...

- Não, tudo bem! – A garota já tinha começado com os “desculpas”. – Escuta, eu percebi que você tinha interesse em participar mais do nosso grupinho e tal...

- Ah, tenho sim! – Respondeu rapidamente.

- Então... – Continuou a outra, ignorando a interrupção. – Pois é, eu estive meio doente ontem e...

- É, eu fiquei sabendo, que pena! – Interrompeu novamente. Vicky já estava ficando irritada.

- Pois é, então eu não pude acompanhar uns acontecimentos, será que você poderia me deixar a par de algumas coisas?

- Claro, só me diga o que quer saber! – Estava prontificada a ajudar Vicky, sempre quis fazer parte da “panelinha”.

- Você sabe de algo sobre a Mel? Por que ela está internada?

- Bem, a Bianca acabou de dizer para quem quisesse ouvir que Mellanie estava grávida e que tentou abortar. – “Então é verdade”, pensou. Seus sentimentos estavam, novamente, misturados.

- Quem é o pai, você sabe?

- O Kadu. – Tânia fechou os olhos ao dar essa notícia, imaginou a fúria da loira quebrando o telefone na sua cabeça.

- Está bem, obrigada. – Disse com educação. – Nos vemos depois.

- Beijos.

Vicky olhou para baixo. Estava atordoada, era muita coisa inesperada acontecendo ao mesmo tempo. Quando será que tudo vai se ajeitar? O ódio estava a consumindo, não poderia ficar ali, no seu quarto, nem mais um minuto. Pegou a bolsa e saiu. Desceu as escadas correndo, abaixo delas, havia outra surpresa.

- O que você está fazendo aqui?

- Assim que eu ouvi os boatos lá no colégio uns 20 minutos atrás, vim me explicar. Professor de matemática que me desculpe.

- Não quero saber de você! Quem te deixou entrar? – Estava começando a ficar alterada.

- Sou seu namorado há anos, não me barram mais na entrada.

- Não te barravam, né meu filho? Não te barravam! – Gritou ela. – Vou avisar agorinha mesmo que você está proibido por aqui.

- Vick, raciocine, isso é pura mentira. Como eu poderia engravidar a sua melhor amiga? Não faz drama! Se me dissessem que tem um elefante cor-de-rosa fazendo malabarismos com fogo, seria mais provável de acreditar do que isso!

- Eu não quero saber das suas explicações. E eu estava de saída, você vai se retirar por bem ou vou precisar chamar alguém para te expulsar daqui?

- Então é assim? Depois de anos de namoro, você vai preferir acreditar numa fofoca que em mim? – Perguntou, incrédulo.

- Ah, claro! Anos de namoro, de carinho, de dedicação máxima, não é Kadu? – Constatou ironicamente.

- Pode ser que não tenha sido assim. Pode ser que não, mas nosso namoro sempre foi harmonioso e pacífico. A gente nunca chegou nem a ficar sem se falar, nem a brigar sério um com o outro, sempre nos demos muito bem e você vai jogar isso tudo fora por causa de um boato?

- Sabe por que a gente não briga, Carlos? Porque a gente não ta nem aí um pro outro, a gente não se importa. Nosso namoro é viajar um pouco nas férias, dar uns amassos em qualquer lugar e só. A gente não conversa, a gente não ri, a gente não se diverte...

- Mentira! Eu me divirto com você!

- Ah é? Fazendo o quê? Sexo é que não é!

- Mas você mesma disse que não queria! A gente podia fazer...

- Não, porque aí nosso namoro não seria mais só beijos, seria só sexo. E não é o que eu quero pra mim.

- Você está dramatizando! Claro que eu ligo pra você! – Contestou ele, já sem ter o que falar.

- Liga? Eu quase morri ontem, minha garganta inchou a ponto de fechar, você não foi comigo na ambulância, não foi lá me ver, não me ligou hoje de manhã e eu recebi flores, mas adivinha só! Não eram suas!

- De quem eram? – Perguntou ele em um tom bravo.

- E agora a primeira coisa que eu ouço na manhã que você engravidou a Mel! Acabou, Kadu. – Ela colocou os óculos de sol antes de sair ligeiramente pela gigantesca porta principal. Entrou em um carro que já estava parado na porta da mansão e disse ao motorista a direção. Ele não teve tempo de se explicar.

~ Ѽ ~

- Oi. Que bom que te encontrei acordada.

- Oi! – Respondeu Mellanie, vendo a figura da melhor amiga. Tinha cansado de ficar sozinha a manhã toda.

- Como se sente? – Perguntou friamente.

- Bem, obrigada.

- Olha, eu vim te dizer que preferia se, daqui em diante, você ficasse longe de mim.

- O que? Por que? – Mel ficou assustada, fez menção de levantar-se do leito, mas Vitória colocou a mão sobre seu peito e a fez continuar deitada.

- O boato que corre por aí é que você estava grávida... – Abriu as persianas das janelas do quarto - ...do kadu.

- Isso é ridículo! - Alterou-se – Vi, eu juro pra você, amiga, eu nunca tive nada com o Kadu. Nada!

- Eu sei.

- Então por que...?

- Você acha que se minha melhor amiga estivesse tendo um caso com o meu namorado eu não iria saber? Claro que eu sei que não era do Kadu. Era do Rafa não é? – Ela fechou os olhos e abaixou a cabeça. – Meu Deus, Mellanie! Por favor, não quero mais saber de você.

- Se você disse que não acreditou, então por que está...?

- Por que? Você ainda tem coragem de me perguntar o porquê? Mellanie, eu te considerei minha melhor amiga, te contei tudo, meus segredos, meus desejos, meus sonhos e até minhas “conversas” entre quatro paredes com o meu namorado! Te contei meus receios sobre sexo, tudo! Eu confiava em você, Mel! E aí você fica grávida do melhor amigo do meu namorado e, ainda por cima, na chácara da minha família e me diz que é intoxicação alimentar?
- Como você sabe que foi...

- Na chácara da minha família? Pelo amor de Deus, Mellanie! Eu posso me fazer de sonsa, mas eu não sou! Eu sei contar, pra você ter tomado pílula do dia seguinte só pode ter sido aquele dia! E também percebi a mudança no seu comportamento. Mas isso não é importante. O que me deixou fula da vida é que você não confia em mim! Eu deveria ser a primeira a saber, mas fico sabendo por uma figurante chamada Tânia que ouviu tudo da boca da Bianca! Pra mim não dá mais, Mellanie. Nossa amizade termina aqui. Eu poderia perdoar tudo, mas confiança é a base de qualquer relacionamento. Se você não tem confiança, você não tem nada.

- Vick, mas eu confio em você... – Mellanie tentou discutir, mas estava fraca. Mal conseguia manter os olhos abertos e a voz firme.

- Se confiasse, teria me contado. Não teria mentido sobre uma coisa tão importante. Enfim, vim só te falar isso. Desculpe ter vindo dizer tudo com você nessa situação, mas eu precisava colocar um fim logo. Adeus. – E saiu do quarto antes que a primeira lágrima escorresse pela sua face.

~ Ѽ ~

- Eu sabia que iria te encontrar aqui... – Kadu disse para uma figura alta e loira que estava arremessando freneticamente uma bola de basquete alaranjada na cesta. Não acertara nenhuma.

- Pois não? – Rafa perguntou, sem nem encarar o ex - melhor amigo.

- Precisamos conversar! – Kadu gritou para um Rafael que parecia não ouvir. Escutou o eco de sua voz na quadra vazia.

- Interessante. – Respondeu depois de vários minutos. – Conversar sobre o quê?

- Você sabe sobre o quê! – Respondeu o outro, chegando mais perto.

- Tem razão. – Rafa soltou a bola e virou-se para encará-lo. – Sei. – Colocou a mão direita sobre o bolso de trás e apertou o canivete que lá se encontrava.

~ Ѽ ~