- Meu amor! O que está fazendo escondidinho aí? – Exclamou Jacky ao avistar Rafael, incrédulo e paralisado, encostado na parede do beco. Tinha sabido pelas más línguas do incidente com o Daniel, mas estava pouco se lixando. Ela estava mais feliz com a reconciliação que tiveram pelo telefone na noite anterior, logo após a saída do garoto da festa da Vick.
- Não encoste em mim! – Ele urrou com toda a força que poderia, se afastando da morena de olhos castanhos profundos. Ela ficou assustada, ontem mesmo tinha ouvido pelo telefone que era a única pessoa em quem ele poderia confiar e a única garota que sempre fora fiel ao relacionamento e que, realmente, gostava dele. Não estava entendendo essa mudança repentina de humor.
- Qual foi o problema agora, amor? É por causa do Daniel? O que é? Eu sei que não foi sua culpa... – Ela tentou acalmá-lo enquanto ele enterrava as mãos nos cabelos e abaixava a cabeça procurando não ouvi-la.
- Pára de fingir! CHEGA! – Gritou com ela no nível mais algo possível.
- Fingir? Rafael! – Lágrimas começaram a despencar sobre sua face. Está certo que não era um anjo de pessoa, tinha suas picuinhas com Vicky e, principalmente, com Mel, aquela que sempre que tinha oportunidade tentava-lhe roubar Rafa, mas nunca fingira nada com relação aos seus sentimentos por ele. Não estava entendendo porque estava sendo alvo da gritaria e não suportava que gritassem consigo.
- O quê? Você achou que eu nunca fosse descobrir? O quão estúpido você acha que eu sou, Jaqueline? Você achou que eu nunca fosse desconfiar dessas suas manipulações diabólicas? Eu não sou sua marionete, caramba!
- Descobrir o quê? Por que você ta gritando comigo? – Disse ela entre lágrimas e choro. – Você está sendo injusto! Eu não acho você estúpido!
- Mas eu sou, Jaqueline! Eu sou! E sabe por quê? Porque eu acreditei nessa armação sua e das suas amiguinhas!
- O quê? Dê quê está falando? Do damasco? Eu não achei que uma alergia te atingiria tanto! – Ela começou a proferir as palavras rapidamente tentando entender o motivo da discussão. Sim, era culpada no caso do damasco, mas por que isso agredira tanto o Rafael? Não sabia que ele era tão amigo da Vitória...
- Pára de dissimular! Estou falando da gravidez, droga! Da possível gravidez da Mel antes de tomar um monte daquelas pílulas malucas. Do filho que você, Amanda e Bianca inventaram que era do Kadu, meu melhor amigo! Isso foi o fim, Jaqueline, o fim. Você conseguiu, me destruiu. Destruiu minhas amizades, destruiu minha consciência, me fez machucar um dos meus melhor amigos, destruiu minha relação com a pessoa que mais amo no mundo e tudo pra quê? Pra eu ter só você, não é?
- Não! Eu não sabia que era mentira!
- Você é doente. Precisa de um psiquiatra.
- Não! – Ela berrou entre as lágrimas que escorriam sobre suas roupas de grife. Suas mãos trêmulas seguraram a camiseta ainda suja de sangue do ex-namorado, tentou mirá-lo nos olhos, visualizou sua imagem embaçada por entre o choro incessante. – Acredita em mim!
Ele usou a força para retirar as mãos dela grudadas em sua roupa.
- Nunca mais se atreva a encostar em mim. – Fez a ameaça e saiu andando, notando que, as pessoas que ainda estavam paradas na porta do colégio esperando alguém buscá-las ao fim da aula, o encaravam com repulsa, certamente já sabiam do caso do Daniel. Pegou um táxi o mais rápido possível para tentar consertar as coisas.
Jaqueline ajoelhou-se ainda chorando no lugar escuro em que se encontrava, estivera tão feliz por ter reatado o namoro e agora estava em prantos em um local imundo. De repente, uma raiva mortal começou a correr em suas veias, Bianca a enganara. Nunca se importou em espalhar fofocas que fossem mentira contanto que soubesse a verdade, contudo, Bianca a fizera acreditar nisso, usou-a como peça do próprio jogo e isso era imperdoável.
~ Ѽ ~
- Como se sente?
- Acho que melhor... – Mellanie tentou sorrir para Alex, tinha acabado de acordar e ele ainda estava ali, estava sendo uma boa companhia.
- Que bom, porque está na hora do remédio! – Ele se levantou e buscou um frasquinho na prateleira do cômodo em que ela estava internada.
- Ah não! – Mellanie reclamou, o remédio tinha gosto ruim, mas bebeu-o sem fazer muito escândalo. – Bem, acho que poderia ser pior... Eu poderia estar tomando óleo de fígado de bacalhau, por exemplo. – Fez uma careta.
- Ah, então já está até fazendo piadinhas? Acho que melhorou mesmo.
- Se for usar disso para me fazer tomar outro remédio... Ainda estou muito mal. – Ela sorriu.
- Não, não... É que, bem cedinho, chegou uma coisa pra você... Eu não quis te entregar mais cedo, percebi que você e Vicky tinham tido uma discussão, quis esperar você ficar melhor, me perdoe.
- Não, você fez bem! Acho que eu não teria cabeça pra me ocupar com outra coisa mesmo... – Respondeu enquanto pegava o pacote que Alex a entregava. - Por falar nisso, ela ligou?
- Ainda não, mas acho que ainda está com um pouco de alergia, deve ser por isso. – Ele tentou despreocupá-la. Sabia de quem era a correspondência, estava bem identificado na etiqueta e, tendo em vista os boatos que Mellanie lhe contara mais cedo, sabia que o embrulho não poderia ser coisa boa, por isso quis esperar uma ligeira melhora do humor para entregar.
Ela fixou o olhar no pacote, era uma caixa de papelão de tamanho pequeno lacrada com fita adesiva comum, nada muito luxuoso, parecia mais uma encomenda. Leu a etiqueta que continha o nome de Rafael Montez em letras bem grandes, estremeceu.
- Está tudo bem? Quer que eu saia? – Alex perguntou tentando ser delicado, talvez ela quisesse abrir sozinha, não era curioso.
- Não, acho que... Acho que tudo bem. – Ela tentou sorrir. Encarou a caixa por mais algum tempo, se perguntou o que poderia estar lá dentro. Certamente, o colégio inteiro já estava sabendo do boato de um filho que, na verdade, talvez nem existiria juntado à mentira deslavada da paternidade do namorado de sua melhor amiga. Portanto, Rafa já deveria estar sabendo e, conhecendo-o bem como ela o conhecia , deveria estar puto da vida. Ela ainda estava meio zonza por ter acabado de acordar e sua imaginação fértil apurou os ouvidos para escutar se haveria algum tic-tac vindo de dentro do embrulho.
Tomou coragem e começou a arrebentar, impacientemente, as fitas adesivas que prendiam o papelão. Finalmente, conseguiu abrir um buraco na correspondência e percebeu que existia pedaços de pano e um cartão pequeno lá dentro. Franziu as sobrancelhas e puxou a peça vermelha-sangue que lá havia, era um lingerie de renda minúsculo composto por uma calcinha fio dental e um top transparente quase tão pequeno quanto a parte de baixo. Ficou duplamente ofendida e boquiaberta, Alex arregalou os olhos ao ver aquilo. Tremendo de raiva, segurou o cartão que acompanhava a vestimenta, em letras sem nenhum capricho estava escrito:
“Para usar na próxima vez. Não quero que você repita o traje quando estiver com dois caras em noites seguidas de novo. Depois discutimos em que posição você me pagará o preço disso ;)
Rafael”
Mellanie não sabia se chorava ou se gritava. Arremessou a caixa, as peças vermelhas, o cartão e tudo o que estava ao seu alcance na parede, deixou a histeria tomar conta de si. Alex tentou segurar seus pulsos enquanto ela se debatia de raiva, ainda na cama do hospital e presa por alguns fios e agulhas que tentava tirar das veias no ápice da ira. Repentinamente, parou de reagir, desabou em choro nos ombros do novo amigo. Ele a abraçou sem jeito e, pela primeira vez, tinha completa solidariedade por alguém que julgava ser bom e que, de maneira nenhuma, merecia isso tudo que estava acontecendo.
- Mel! – Rafa chegara nessa hora, achava que poderia impedir que ela recebesse o pacote, tinha a pequena esperança de que só entregariam quando ela se recuperasse, mas ao chegar no quarto e ver tudo jogado pelo chão, entendeu que era tarde demais.
- O que você está fazendo aqui? – Alex falou em um tom baixo, mas firme, não queria causar um escândalo no hospital.
- Eu vim falar com ela, dê licença. – Rafael ordenou, ainda na porta, mas Alex não saiu da frente, Mellanie continuou com o rosto enterrado no travesseiro, se sentia humilhada e envergonhada.
- Você não tem nada pra falar com ela, não bastou mandar essas porcarias pra acabar com ela, mesmo sabendo que ela estava internada?
- Você não tem nada a ver com isso.
- Tenho. Tenho sim e digo mais: pra falar com ela vai ter que passar por cima de mim. – Rafael estava disposto a massacrar Alex para poder falar com ela, para poder se desculpar, mas não pôde. Colocou-se em posição de ataque, mas antes que pudesse pensar, recebeu um soco na face que o deixou atordoado. Alex recolheu a caixa, o cartão e as peças de roupas e jogou-as na cara do outro, bateu a porta do quarto. Voltou-se para a garota, ainda chorosa e indisposta a mostrar o rosto. Sentou na cama ao seu lado. – Está tudo bem... Não vou deixar ele chegar perto de você de novo... Vou lá fora agora mesmo pedir que não deixem que ele volte a entrar aqui, vou avisar pra ele, tudo bem... – Passou a mão, carinhosamente, nos cabelos negros dela.
- Não, fica aqui. – Ela respondeu, a voz abafada pelo travesseiro.
- Não vou sair daqui. – Ele sorriu.
~ Ѽ ~
Rafael estava disposto a arrebentar aquela maldita porta para conseguir consertar as coisas pelo menos com a Mel, tinha sido um perfeito idiota nos últimos tempos, ela teria que perdoar-lhe, teria entender que também fora vítima de toda a mentira. No fundo de sua consciência, sabia que não reagira ao soco dado por Alex porque, no fim das contas, era o que merecia por ter sido tão canalha.
- Mas eu já não te falei pra ficar longe? – Ouviu a voz nervosa de Bianca ressoar pelos corredores brancos do hospital.
- Não vim ver você.
- E daí? Sua presença fétida me incomoda.
- Some da minha frente.
Ele falou isso com um ar tão psicopata que ela se assustou e resolver sentar e esperar na recepção, não no corredor, como havia dito ao pai do Daniel. A verdade é que Rafael não passava de um desequilibrado, mal ouviu a mentira e já atacou um dos melhores amigos, sabe-se lá o que poderia fazer com ela, mesmo em um lugar cheio de gente. E, também, não tinha mais o que falar com ele, já tinha dado o recado, já tinha zombado da estupidez do garoto, já havia tripudiado ao máximo do fundo do poço em que ele se encontrava, estava bom o bastante, por hora.
Assim que se sentou, ouviu um toque conhecido, era o seu celular. Encarou o identificador de chamadas. Imaginou o que ela queria a essa hora, nunca telefonava por motivos insignificantes.
- Alô, Jacky?
- Onde você está? – Bianca ouviu a voz de Jaqueline trêmula e, ao mesmo tempo, fria do outro lado da linha.
- No hospital perto do seu condomínio, estou acompanhando meu namorado, que foi atacado pelo seu, aliás.
- Estou indo te encontrar. – E desligou sem falar mais uma palavra sequer.
~ Ѽ ~
Camilla deitou-se na cama do quarto mal iluminado, estava arrasada. Alex fora o único que a ajudara naquele ninho de cobras e agora não podia mais falar com ele porque alguma víbora inventara que ele era um assassino. È claro que ela o compreendia, se continuasse insistindo em ficar perto dela, iriam mesmo tirar más conclusões disso. O que restava é encontrar a fulaninha culpada por esse boato e, pela primeira vez, enfrentar uma outra pessoa e vencer.
Estava disposta a passar por cima de qualquer ridícula que tivesse inventado esse boato, mas seus pensamentos de vingança foram interrompidos pelo toque da campainha. Imaginou quem poderia ser à essa hora numa quinta-feira, dispôs-se a abrir a porta.
Era o carteiro, tinha tocado a campainha do apartamento, pois precisava que assinassem o recebimento da encomenda. “Maldito condomínio sem portaria”, pensou. Recebeu o pacote relativamente pequeno, do tamanho médio de metade de uma caixa de sapato, sentou-se para abri-lo.
Cortou o papelão com as mãos e tudo o que encontrou lá dentro fora uma caixa vermelha de veludo, abriu-a com cautela, seu queixo caiu. Um som contagiante começou a ressonar pela sala mal mobiliada, era uma caixa de música. Uma bailarina de porcelana, mas vestida com trajes de verão dançava ao som de um violão espanhol juntamente com seu par, igualmente de porcelana, vestido com uma bermuda e um colar havaiano. No verso da tampa, em letras fluorescentes estavam os dizeres:
Festa Verão Tropical
Tema praia
Neste Sábado
Rua Olhos d’água – Urca
Por Amanda Wernz
Mais detalhes no verso
Camilla levou algum tempo para se recuperar do susto, desconfiada, olhou mais uma vez para a caixa cor vermelho-sangue. Nunca dissera seu endereço à Mandy e nunca esperaria tal convite, lembrou-se do episódio do suco de uva no primeiro dia da semana. Deveria ser algum engano. Olhou os destroços da embalagem de papelão usada para a encomenda, encontrou um pedaço em que se lia, claramente, seu nome e seu endereço.
Iria prestar atenção nos comentários acerca disso no colégio amanhã e, caso não fosse mesmo uma piada de mau gosto, aceitaria o convite. Seria um ótimo lugar para começar a procurar a fofoqueira.
~ Ѽ ~
- O que você quer, Michelle?
- Quero saber porque foi embora sem mim naquela droga de colégio hoje. – A garota ruiva gritou com o pai por meio do telefone celular.
- Seu irmão foi atacado, não ficou sabendo?
- O fato de ele ser atacado me faz ir flutuando até em casa?
- Não! – O Pai estranhou a pergunta. Como aquela piveta fazia perguntas difíceis! E alguns ainda diziam que a fase era passageira.
- Então não tem justificativa. Tive que pegar um ônibus e fui parar no Catumbi e tudo por quê? Porque meu irmão levou um arranhadinho no braço, puff.
- Aliás, você poderia pelo menos perguntar como ele está!
- Se você faz questão... – Mudou drasticamente a voz para um tom polido e doce – Como meu irmão está, papai?
E quando o homem puxou o fôlego para a resposta, escutou o barulho de finalização da chamada, “menina mal educada”!
- Senhor diretor? – O homem virou-se para encarar a voz feminina que lhe chamava.
- Como vai, Srta. Deville?
- Bem, obrigada. O senhor sabe onde está a Bianca?
- Ela estava esperando na recepção dois, provavelmente ainda está lá...
- Obrigada. Tenha um bom dia.
Com toda a amargura da voz transmitida aos passos, deparou-se com Bianca na sala onde deveria mesmo estar, sentada sozinha mexendo a colher da xícara de café que segurava. Quando estava se aproximando, ela levantou a cabeça e deu um breve sorriso.
- Por que estava precisando falar tanto comigo? – Bianca se levantou e perguntou, calmamente, antes de sorrir de novo.
- Eu quero que você me ouça, e que escute com atenção. Eu vou acabar com você, vou fazer questão de pisar em você e te quebrar até não sobrar nada e quando eu...
- O quê? Por que está falando isso?
- E, quando eu terminar, - continuou Jaqueline, como se não tivesse sido interrompida - quero que você se arrependa profundamente de ter cruzado meu caminho e que se lembre claramente deste momento porque aí, aí não vai sobrar nenhuma dúvida de quem tornou a sua vida um inferno.
~ Ѽ ~
- Quem é?
- É o Alex, Vitória.
A garota estremeceu, não esperava a ligação ao pôr do sol, ainda mais dele. É claro que não fora um acontecimento ruim, pelo contrário... Mas entre essa série de desventuras, desde a briga com a Mellanie até o recebimento do convite da Mandy – o qual já estava, em mil pedaços, enfiado na lixeira - não tivera tempo para se ocupar com os devaneios acerca do Alex. Aquele cara totalmente diferente dos que, algum dia, já se relacionara, mas que causava um sentimento mais incomum que qualquer outro mesmo o tendo conhecido há, somente, uma semana.
- Aconteceu alguma coisa?
- Não, liguei para pedir um favor.
- Hum... O senhor do universo ligando para uma patty para pedir um favor? Me pergunto o que poderia ser...
- É sério... É a Mel. Olha, eu sei que vocês brigaram, não sei o motivo e nem quero, mas é que as coisas complicaram um pouco e acho que ela precisa de uma amiga.
- Exatamente, você não sabe o motivo, não pode me julgar.
- Não estou julgando, quero que entenda. Ela não tem mais ninguém.
- Ela procurou por isso. – Respondeu em tom de ponto final.
- Eu duvido muito. Ninguém quer ficar sozinho.
- E você está incluído nisso?
- Não vem ao caso. Olha, estou tentando te alertar, você não deveria jogar fora uma amizade verdadeira. Ela está sofrendo muito, dormiu agora e peguei seu número no celular dela. Ela precisa de você.
- Te encontro aí.
~ Ѽ ~
Mellanie abriu os olhos. Tinha passado os últimos minutos com eles fechados pensando que aquilo poderia ser uma alucinação. Não estava disposta a aceitar a perda da melhor amiga. E não era só isso. Vicky mencionou Bianca. “Se Bianca sabe, a escola inteira sabe”, afirmou. Então Rafa já sabia, nunca mais iria olhar na cara dela pensando que o tivesse traído com o seu melhor amigo e, pior, ela não poderia provar quem era o pai agora que a criança em potência já não existia. E, é claro, iria ser julgada por todo o colégio assim que voltasse às aulas. Seria sempre a “amiga traíra” ou a “galinha sem vergonha”. Sentiu vontade de chorar, mas não o fez.
- Está acordada? Vim aqui agora a pouco e você estava de olhos fechados, achei que estivesse dormindo. – Alex perguntou apoiando-se na porta do quarto de hospital.
- Estou. – Ela tentou sorrir. Não iria mostrar fraquezas.
- E então?
- Então o quê?
- Sua amiga Vitória... Saiu chorando uns vinte minutos atrás. Não acho que tenha sido a emoção. – “idiota”, Alex pensou. Era péssimo com as palavras.
- Tivemos um breve desentendimento. Nada muito sério, contudo! - Forçou um sorriso, ele não acreditou. Era ruim com as palavras, mas era bom em decifrar as pessoas.
- Quer me contar por quê?
- Então não sabe da nova mentira da Bianca, Jacky e Mandy?
- Essas meninas são fogo mesmo, não? Desde que cheguei aqui, esta semana, já tiveram uma dúzia de confusões por causa dos boatos que elas inventaram. – Estava tentando conseguir uma nova amizade, por isso mudava tanto de colégio. Era indiferente demais para se prender a alguém, mas já estava cansando da vida solitária.
- São umas cobras venenosas, que ódio.
- Fica calma, você está em recuperação. Me conta o que inventaram dessa vez. – Alex tentou acalma-la.
- Bianca, Jacky e Mandy inventaram que o filho é do Kadu. – Alex se assustou, era uma coisa que nunca teria imaginado, mas não significava que acreditava nisso. É claro que era o plano perfeito das outras para prejudicar a amizade da Mel e da Vicky. – Imagina! O namorado da minha melhor amiga! – Teve que conter as lágrimas novamente.
- Fica calma, Mel..Tenho certeza que ninguém vai acreditar nessa baboseira... Logo a Vitória vai perceber que é mentira, só dê um tempo para ela.
- É, espero que sim. – Respondeu tentando fechar o assunto, não queria ter que explicar ao Alex que, apesar de parecer legal, era praticamente um estranho que conheceu essa semana, que não era esse o problema. Que Vitória não acreditara na mentira da Bianca, mas que ficara furiosa com a mentira dela mesma, Mellanie, sua melhor amiga.
~ Ѽ ~
- E foi assim, crianças, que Napoleão perdeu a guerra. Fim.
- Finalmente esse chato se ferrou, aff. – Comentou Jacky com Bianca ao terminar a aula de história. – Não estava agüentando mais.
- Verdade. Essa aula estava durando séculos, não vou ficar surpresa se vir meu cabelo branco na próxima vez que olhar no espelho.
- 4º período é o mais chato de todos, Deus! – Jogou a cabeça por cima da carteira.
- O que estava a dizer, srta. Deville?
- Nada, sra. Guedes. – Levantou a cabeça para observar a velhinha parada em frente à sua carteira. – Estava só comentando com a Bianca como quero que o 6º período chegue logo. Tenho a sensação de que boas notícias virão no final da aula!
- Que bom, que bom. – Respondeu a velhinha simpática se direcionando para a porta, mas logo voltando-se novamente. – Deville, você viu meus óculos?
- Não senhora. – Respondeu Jaqueline mesmo percebendo que eles se encontravam sobre os cabelos grisalhos dela.
- Obrigada, vou dar mais uma olhada por aí. – Saiu da sala logo em seguida. Bianca riu maldosamente.
- Você acha que o fim da aula vai ser melhor que o recreio? – Perguntou a uma Jacky Pensativa.
- Claro, não tenho dúvidas de que o Rafa está no habitual treino de basquete depois do intervalo, ele nunca perde aquela porcaria. Quando acabar, vai vir me ver porque, adivinha: reatamos o nosso namoro! – Os olhos dela brilharam ao pensar nanisso – Graças à Melzinha que andou dando o que não deveria para quem não deveria. O que foi ótimo, para falar a verdade. Vicky deve estar mais puta do que já é! – Riu alto. – Não vai mais falar com ela, nem com Kadu. Sinceramente, nunca gostei tanto da Mellanie como estou gostando agora. Como você ficou sabendo que ela teve um caso com o Carlos Eduardo?
- Detenção no departamento de artes. – Respondeu com o mínimo de detalhes possíveis para evitar que desconfiasse a verdade.
- Sim, mas como? Melzinha simplesmente te contou ou...? – Quis saber ainda mais a outra. Estava querendo detalhes, é claro. Estava incrivelmente falante depois que soube das novas. O mau humor dos últimos dias tinha simplesmente sumido como fumaça no ar!
- Olha! Sr. Alves está aqui. – Exclamou a negra na tentativa de distrair a outra anunciando a chegada do 4º período.
- Sabe, eu acho que deveríamos ter mais dever de casa... – Jacky disse em voz alta enquanto o professor de química passava pelas primeiras carteiras das filas onde ela e Bianca estavam sentadas lado a lado.
- E provas mais difíceis. – Completou a outra caprichando no sorriso deslumbrante que possuía. O professor sorriu satisfeito ao ouvir “acidentalmente” esse diálogo alto das duas. “Que alunas aplicadas”, pensou. Então sentou-se à mesa dos mestres.
- Ele é tão gato. – Jacky afirmou depois que ele já havia saído da zona de audição.
- Nem me fale! – Esganiçou Bianca animadamente.
~ Ѽ ~
- Então... Sobre o que quer falar? – Rafael perguntou distraidamente enquanto diminuía a distância entre os dois.
- Quero esclarecer as coisas. – Ele respondeu na mesma calma.
- Está tudo bem claro para mim. – Disse antes de tirar o canivete do bolso e apontá-lo contra o ex-melhor amigo.
- Rafa, o que está fazendo? – Kadu perguntou, amedrontado e surpreso, enquanto dava alguns passos para trás.
- Você ainda tem dúvidas? – Sorriu discretamente e avançou.
Kadu olhou para os lados, apesar do porte atlético, não era bom em brigas e, mesmo se fosse, Rafa era bem mais musculoso. Estava pensando em uma saída estratégica quando foi atingido pó um golpe nas costas. O soco dado por Rafa foi o bastante para deixa-lo sem ar por alguns segundos. Ofegou por um tempo, não teria como fugir e Rafael estava fora de si. Resolveu, pela primeira vez na vida, enfrentar o problema.
Segurou o braço esquerdo do outro tentando deter o canivete apontado contra seu peito, empurrou Rafa com as pernas. Ele desequilibrou e caiu no chão da quadra. Kadu aproveitou esse ligeiro tempo em que Rafael lutava para ficar de pé para tentar tirar o objeto pontudo que segurava na mão esquerda. Assim que se aproximou, ele reagiu dando-lhe uma rasteira violenta que o fez cair de costas no chão frio, imobilizou suas pernas pressionando os joelhos sobre os joelhos dele e prendendo o braço esquerdo com sua enorme mão direita. Não tinha como escapar. Fechou os olhos e suplicou engasgando:
- Eu não fiz, Rafa, é mentira eu juro. Eu juro, não fiz isso. – Foi dizendo, desesperado, na maior velocidade que podia. – É mentira, juro por tudo, qualquer coisa, a minha vida.
- Você não pode jurar por algo que vai perder.
Dito isso, Rafa não quis nem mais ouvir, estava cego pela traição e tinha certeza do fato, o outro estava negando somente porque era um covarde. Avançou o canivete em direção ao peito do ex-melhor amigo quando sentiu o baque do golpe que recebera na cabeça. Isso o fez sair de cima de Kadu da mesma forma que a arma escorregou da mão.No chão, vislumbrou o rosto de Daniel, a raiva o fez esquecer que era hora do treino de basquete, Daniel fora o primeiro a chegar.
Refletiu, rapidamente, que isso significava que teria pouco tempo para fazer o que tinha planejado antes que os outros chegassem.
- Rafa você enlouqueceu, cara? Tá maluco? – Daniel gritou surpreso com a briga dos dois, antes melhores amigos. – Vocês são amigos, cara, é só uma garota! – Exclamou enquanto ajudava Kadu, já todo esfolado, a levantar-se. Rafa aproveitou para recuperar o canivete.
- Não é só uma garota! – Respondeu, firmemente, antes de avançar de novo. Viera para machucar Kadu, mas se o outro fazia questão de impedir-lhe, assinara a lista também.
Daniel colocou-se em posição defensiva e tentou segurar o braço esquerdo do Rafael para impedir que a arma pontuda ferisse alguém. Rafa lhe devolveu com uma cotovelada no estômago que o fez ajoelhar-se no chão. Kadu tentou um golpe por trás, mas o outro se defendeu com um chute tão forte que caiu novamente. Rafael pisou-lhe o estômago, desta vez, só para fazê-lo gritar de dor. Chegara a hora. Investiu o canivete contra o pescoço dele , mas foi, mais uma vez, interrompido por Daniel que segurava, com as duas mãos, o braço com que estava armado. Rafa fez a força contrária e cravou a lâmina afiada no japonês que urrou de dor ao sentir o golpe. Deitou-se no chão em meio ao sangue que jorrava do antebraço onde o canivete ainda estava enterrado. Rafael ficou horrorizado com a cena, acabara descontando a fúria em um amigo que não tinha culpa alguma nessa história. Chegou mais perto, a fim de ajudar, mas Kadu pôs-se na frente, pensando que ele queria terminar o serviço.
- Vai embora, desgraçado! Some, Rafael! – Gritou com toda a raiva que poderia. Se Rafael preferia acreditar na mentira e machucá-lo pra valer já era uma prova da falta de caráter, mas ferir um amigo inocente era passar dos limites. Estava tão raivoso que pensou em espancá-lo até a morte, agora que era um covardão desarmado, mas quando iria avançar, escutou passos. O resto do time estava chegando, pelo visto, Rafael também os ouviu pois, rapidamente, pulou a grade do lado oposto da quadra e sumiu.
- O que aconteceu aqui? – Perguntou o treinador, seriamente, com o humor já alterado percebendo Daniel sangrando no chão. Ele gemeu de dor em resposta. – Carlos Eduardo, você está encrencado. Diretoria, agora!
- Mas eu não fiz isso! Não o machuquei, foi o Rafael! – O time todo encarava os dois com o mesmo ar de surpresa. Certamente, não sabiam o que estava acontecendo ali, mas seja o que fosse, não era bom.
- O Rafael nem ao menos compareceu às aulas hoje, está com falta na portaria. Não invente, Eduardo! – Ordenou com toda a rigidez e impaciência possível. “Isso é o que se ganha por trabalhar com esses moleques”, pensou o treinador.
- Ele... ele tá certo! – Daniel custou a dizer. – Rafael me esfaqueou... – Falou lentamente olhando para o teto, visto que a dor chegava a cegar-lhe.
- Sim, senhor! Rafael estava aqui, nos esperou chegar e nos atacou! – Kadu confirmou aliviado o que o amigo dissera. Só faltava essa, além de fura-olho virar o psicopata do colégio atacando os colegas do basquete.
- Leonardo, Samuel, ajudem-no a chegar até a enfermaria, o antebraço está sangrando demais, ele está perdendo muito sangue. Depressa. – Um careca bastante alto e o cabeludo ao seu lado começaram a se mexer em direção ao colega caído. – Eduardo, você vem comigo até a diretoria.
- Mas eu já expliquei que não fiz nada!
- Não interessa. Você foi testemunha do ataque a um aluno dentro da instituição e, pior, contra o filho do diretor! Ele vai querer achar o culpado...
- Eu já disse que foi o Rafael, droga! Será que ninguém acredita em mim?
- Rafael enlouqueceu? É o cestinha do time, por que diabos atacou um companheiro? – O técnico bradou em bom som e ouviu-se o eco pela quadra.
- Eu tenho um palpite! – Gritou um jovem alto, moreno e cabeludo em tom de zombaria. Os outros todos, com exceção do treinador, Kadu e Daniel, riram.
- Aposto 50 que a Mel está nessa! – Gritou outro jovem, mais baixo e descorado, ao lado dele. Ouviram-se outras risadas. Daniel já havia desaparecido de vista, amparado pelos companheiros que o estavam ajudando a chegar à enfermaria.
- 100 que o filho do Kadu também foi motivo desse ataque! – Outro garoto atreveu-se a berrar aos demais que tentaram segurar o riso em vão. Incrível como a fofoca corre rápido naquele colégio, bastou Bianca mencionar isso no intervalo que o rosto de Kadu já estava impresso na primeira página do jornal das más línguas. Cansou disso, saiu da quadra em direção à diretoria.
~ Ѽ ~
Ouviram-se passos no corredor cor de creme do 1º andar, o salto agulha arranhava a cera passada no chão logo cedo. A mulher de imensos cabelos louros e cacheados bateu na porta onde estava incrustada uma placa com os dizeres “diretoria”.
- Quem é? – O diretor perguntou, estressado já de manhã. Era, provavelmente, algum aluno fresco vindo reclamar sobre algum chiclete que grudaram em sua mochila.
- Vim trazer os relatórios que o senhor pediu. – Respondeu, educadamente, a mulher esbelta que carregava uma pequena pasta cor de amora.
- Ah, claro. Entre, Srta Montez. – O diretor, descendente de japoneses e bastante alto, aproximou-se da porta para receber a professora.
- Obrigada. – Disse ela baixinho antes de jogar a pasta e as folhas voarem pelo chão da sala.
O diretor beijou-lhe os lábios enquanto trancava a porta. Passou as mãos pelas costas da mulher bastante bonita, enquanto desabotoava seu sutiã e acariciava seus seios. Ofegante, ela disse:
- Não temos tempo... Faltam 8 minutos para começar o 4º horário... – Ela disse, mas não foi ouvida. Ele deitou-a sobre a mesa, derrubando um globo terrestre miniatura, um porta lápis e um bocado de pastas no piso. Beijou-lhe o pescoço com fervor e voracidade.
- Bom... O que quer fazer nos 5 minutos restantes? – Ela ouviu, sorriu.
Mordeu os lábios dele e sugou-os enquanto tentava tirar a saia social marrom bombom. Ele ajudou-a a retirar a peça e passou as mãos por dentro de sua calcinha de renda, ela suspirou e gemeu. O telefone tocou.
- Droga! – Sussurrou Nakaíme. – Vou ter que atender, a secretária pode resolver vir aqui caso eu não responda.
- Rápido. – Beatrice respondeu ofegante antes de apoiar a cabeça na mesa da diretoria.
- Sim, Odete? – Ouviu-se a voz feminina da secretária do outro lado da linha. – Não, diga que agora estou ocupado, peça para ligar mais tarde. – Odete respondeu, impacientemente, com ruídos que só o diretor pôde entender. – Tudo bem, repasse a ligação. – Respondeu ele contrariado e sentou-se ao lado da loira, ainda deitada seminua sobre sua mesa. – Como vai, doutor Adamatti? – Forçou um tom amigável como se ele não tivesse interrompido uma interação íntima prestes a ocorrer. - Sim, a Srta. Odete me informou que o Alex faltou à aula hoje. – Houve uma grande pausa. Beatrice pôde ouvir o político falando duramente do outro lado da linha, provavelmente, dando um sermão no colégio que não avisara a ausência do filho. – Sim, sim, o doutor tem razão. – Ichiro Nakaíme disse, eventualmente, entre textos enormes vindos do outro lado da linha. Sua face estava muito entediada, mas fingia grande interesse toda vez que concordava. Passou a mão por cima das coxas da professora e foi subindo até alcançar a calcinha branca, ela arregalou ligeiramente os olhos com a surpresa.
O diretor segurava o telefone com uma mão e, com a outra, esfregava os dedos na calcinha da loira, ela fechou os olhos com a sensação. Depois de afirmar, mais uma vez, o quanto Adamatti pai estava correto, afastou a aba da calcinha e esfregou os dedos com mais intensidade no sexo da professora Mendez. Ela gritou de prazer.
- O que foi isso? – Adamatti, irritado, interrompeu o sermão quando ouviu o grito.
- Hum, nada. Acho que a Odete tropeçou em uma de suas samambaias de novo, prossiga. – Ouviu-se a continuação das palavras do outro lado da linha. Ichiro colocou o dedo indicador sobre os lábios, sinalizando silêncio. Então, voltou a acariciar intimamente a Srta Mendez. Ela apertava os olhos, contorcia o rosto e respirava ruidosamente, na tentativa de não atrapalhar novamente a conversa. Quando ele aumentou a intensidade, teve que cobrir a boca com as duas mãos para evitar que escapasse um gemido sequer. – Tudo bem, vou ser mais ágil e freqüente na tarefa, doutor. – E aumentou ainda mais a agilidade dos dedos. – Assim está bom para você? – Beatrice balançou a cabeça positivamente enquanto mais palavras eram ditas por Adamatti. – Ótimo, irei providenciar tudo isso, um bom dia. – E assim que desligou o telefone, agarrou os cabelos da professora, enquanto despia as próprias calças.
- O sinal já tocou faz tempo... Temos que parar. - Disse ela entre os suspiros, tentando raciocinar.
- Paramos se você quiser. – Disse ele, chupando seu pescoço. Ela agarrou o cinto preto das calças dele e retirou-o com violência, pouco antes de escutar batidas na porta.
- Inferno! – Resmungou baixinho Ichiro enquanto apressava-se a se vestir de acordo com a sua função de diretor na instituição.
- É o Crosara! - Beatrice pôs se de pé com o susto, pegou o sutiã, a saia e a blusa que estavam jogados pelo chão e começou a vestir-se também.
– Como sabe? Ah... Não vai dar tempo! – Ele sussurrou. – Ela embolou as roupas na mão, correu para o banheiro da sala e encostou a porta.
- Diretor Nakaíme?
- Sim? – O diretor deu uma última ajeitada e destrancou a porta, encarou Kadu. – O que deseja?
- O treinador me mandou vir... Posso, talvez... entrar? – Perguntou desconfiado com essa atitude.
- Claro, entre. – Afastou-se da porta para que o jovem alguns centímetros maior entrasse. Kadu encarou a sala, percebeu o tapete desordenado e os objetos caídos próximos à mesa. Entendendo o que o garoto estava olhando, disse: - E Odete ainda diz que vem aqui para limpar! Essas secretárias de hoje... São contratadas para arrumar e acabam bagunçando! – Riu.
- Ah... – Respondeu ele enquanto sentava em uma poltrona em frente ao brasão do colégio.
- Então, como posso ajudá-lo, Carlos Eduardo?
- Bem, eu vim explicar a história do que houve com o Daniel, olha eu não tive culpa, quem deve se ferrar mesmo é o Raf...
- O que tem meu filho? – Interrompeu o diretor, preocupado.
- Rafael o atacou! – Beatrice, ao ouvir isso, resmungou um palavrão que foi ouvido apenas pelas paredes do banheiro da sala do diretor.
- Como assim? – Ichiro levantou-se bruscamente. – Onde ele está?
- Na enfermaria, calma, não foi nada muito grave. Foi só o imbecil do Rafael que deu a louca e começou a distribuir facadas.
- E não tinha ninguém lá vendo isso? Ninguém fez nada?
- Não, só estávamos eu e Rafael na quadra, então o Daniel chegou, tentou me defender, mas aí o Rafael ficou mais furioso e retomou o canivete, me derrubou no chão e enterrou a droga da arma no braço do japa... – Foi contando toda a história, rapidamente, sem parar para respirar. Omitiu a história com a Mel, já estava ruim o bastante com todos os alunos sabendo, isso não precisaria se espalhar, também, pelo corpo docente. O diretor ouviu tudo com calma e, ao mesmo tempo, com preocupação.
- Tem certeza de que não é grave? Acho que precisamos chamar uma ambulância!
- Vai saber... À essa hora a enfermeira já deu um jeito no braço dele, sei lá.
- Quero que me acompanhe até lá, ele precisa confirmar a sua história.
- Ok, vamos? – Kadu levantou-se rapidamente da poltrona, querendo resolver isso o mais rápido possível.
- Hum... Vá andando na frente, vá chamar o treinador também para que, caso eu preste queixa na delegacia, ele descreva o tipo psicológico desse delinqüente.
- Ah... Tudo bem. Vou indo... – Apressou-se a sair da sala e sumiu no corredor cor de creme. Logo que isso aconteceu, Beatrice saiu do banheiro, bastante assustada.
- Você não vai prestar queixa, vai?
- Claro! Não vou deixar que um aluno quase mate meu filho à facadas dentro do colégio o qual dirijo! – Disse em tom alterado, mas logo baixou a voz pensando que Odete, na sala ao lado, poderia ouvir seu diálogo “supostamente” sozinho.
- Não faça isso, por favor. Te peço, por favor. Abafe o caso, invente alguma coisa, sei lá, você pode... – Ela começou a suplicar rapidamente, mas sem perder a elegância.
- Por que raios no inferno eu faria isso? – Perguntou mais irritado ainda por lhe pedirem tal favor.
- Estamos falando do meu Rafael, meu filho!
~ Ѽ ~
- Tem certeza de que está bem? Assim que os jogadores espalharam esse caso pelo colégio, eu vim correndo te ver, bebê. Onde dói, amor?
- Fica calma, Bibi... – Respondeu ele com a voz cheia de bajulação. – Já me deram um remédio para a dor, já extraíram a droga do canivete e já fizeram um curativo... Eu estou bem. – Sorriu e encostou nas bochechas dela.
- Estou com ódio mortal daquele Rafael, você não tinha nada a ver coma história daquela suburbana e acabou pagando o pato. – Bianca fechou as mãos com força por causa da raiva que estava sentindo. Estava ali, na enfermaria do colégio, encarando o namorado com um curativo enorme no braço por causa de um chifrudo esquentadinho e uma vaca grávida. Que ódio.
- Na verdade, ele estava tentando matar o Kadu, eu tive que ajudar...
- Por que infernos não deixou o Kadu se ferrar? Você não tinha nada a ver com esses... – Escutou a porta se abrindo. O diretor estava entrando no quarto seguido por Kadu e o treinador do time. Parou de falar.
- Bom dia. – Disse a enfermeira, por trás de uma parede de vidro. – Ah! Senhor diretor! – Adocicou muito mais o tom assim que viu o japonês no cômodo. – Eu estava aqui a pegar os relatórios do incidente com a gracinha do seu filho! – Sorriu de orelha a orelha, Daniel fez uma cara de nojo. – Acredito que vão precisar quando levá-lo ao hospital.
- Bom dia... – Virou-se para o filho. – Como você está?
- Bem melhor, pai. Oi Kadu, – acenou a cabeça – treinador.
- Não se preocupe Daniel, vou tirar o Rafael do time, isso não vai ficar assim... – O treinador começou a derramar palavras de justificativas. Estava muito claro que sentia um pesar enorme por ter que tirar o cestinha do time e sacrificar o campeonato, mas não poderia deixar que seu trabalho fosse colocado em cheque, assim, tão facilmente. O garoto não respondeu, não queria que nada disso estivesse acontecendo.
- Como está o braço, cara?
- Nem dói mais, mano. – Respondeu a Kadu, não querendo parecer um bebê chorão.
- Claro que não! Depois de um choro e cinco analgésicos, nem poderia! – A enfermeira gargalhou e sorriu, querendo mostrar o bom serviço que desempenhara. Daniel fechou cara para ela.
- Norma, você disse... hospital? – Perguntou Ichiro, bastante preocupado.
- Sim, sim! Temos uma enfermaria e enfermeiras, claro, muito especializadas e prestes a desenvolver as necessidades de todos os alunos dessa digníssima instituição. – O diretor levantou as sobrancelhas, não queria ouvir esse discurso babado. – Porém, não temos a condição de satisfazer necessidades mais graves, como foi a do seu filho, eu retirei a arma com cuidado para não danificar ainda mais os tecidos e vasos, dei-lhe um remédio para a dor, um antiinflamatório e fiz um curativo básico, mas creio que, em um hospital, teriam mais recursos para examinar e tratar o acidente. E, também, é preciso um médico para receitar os remédios para esse tipo de ferimento.
- Então vamos a um hospital agora mesmo.
- E o Rafael? – Perguntou Kadu para o líder do colégio.
- O que tem ele?
- Como vai ser punido? Vai ser expulso?
- Tudo ao seu devido tempo, Sr Crosara. – Kadu não gostou da resposta.
- Eu vou com você até o hospital, amor! – Bianca se impôs.
- Não acho que será necessário, Srta Bittencourt.
- E por quê? – Ela perguntou, ameaçadora.
- Deixa ela vir, pai... Bom que me faz companhia...
- Então vamos logo. – Viu que não teria como discutir, acenou para a enfermeira, que estava toda sorridente e dirigiu-se para a porta. Bianca ajudou o namorado a se levantar, pegou na sua outra mão e auxiliou, também, ao descer as escadas. No hall de entrada, ela, Daniel e o pai, se despediram de Kadu e o treinador que iriam fazer uma busca no colégio para encontrar o amigo culpado por isso, Rafael. Vários alunos cochichavam e conversavam nas escadas e em frente à porta principal do colégio, o sinal da saída já havia tocado. O diretor pediu que eles esperassem na calçada para que fosse até o estacionamento buscar o carro que iria conduzi-los ao hospital. Foi então que Bianca o viu.
Rafael estava ali, no estreito beco entre o colégio e o prédio ao lado, encostado na parede, olhando para o chão. Certamente estava esperando que Daniel saísse para poder verificar o tamanho do estrago que causara. Bianca o encarou, as mãos tremeram, mas Daniel não o viu, estava absorto nos próprios pensamentos. Quando olhou em direção à rua, percebeu que tinha sido encontrado, mas o tempo foi insuficiente para sair dali, ela já estava caminhando firmemente em sua direção, com a mesma cara de um Pit Bull em seus piores dias. Daniel ainda estava lá, de costas pra eles e parado a alguns metros de distância, visualizando o movimento dos carros.
Bianca cerrou ainda mais as sobrancelhas ao chegar mais perto do agressor do seu “bebê”, Rafael, assustado, arregalou os olhos, ela estava irada. Apressou os passos firmes e, assim que o encontrou, deu-lhe um tabefe no rosto.
- Imbecil! Se você encostar os dedos em um de nós de novo, juro que chamo meu pai pra te prender, ô moleque! – Gritou com toda a raiva que podia, sempre achou que esse Rafael era o maior espancador, bem que tentou abrir os olhos de Jaqueline!
- O que pensa que tá fazendo, sua louca varrida? – Ele urrou enchendo-se de raiva novamente, nunca tinha levado tapa de mulher e estava realmente preocupado com o amigo.
- Estou defendendo o que é meu, ignorante. E não grita comigo, seu sem educação, não sou mulher de caminhoneiro, desse tipo da Mellanie, que aceita esses seus desacatos de bêbado! – Ele ficara ainda mais furioso ao ver que ela havia tocado no nome daquela cujo nome não queria ouvir nunca mais.
- Olha aqui garota, nunca te passou pela cabeça que você é uma puta de uma intrometida? Você não toma semancol não? Nada disso é assunto seu, diabos! Por que fica espalhando isso toda hora, o tempo todo, metendo esse seu narigão onde ninguém te chama? Você não tem vida própria pra cuidar não ou é uma pobretona fofoqueira de boutique mesmo? – Ela ficou boquiaberta e apontou-lhe o dedo indicador.
- Boutique? Boutique é onde a sua adorada Mel vai parar, lavando o lavabo, claro, pra pagar as contas do seu catarrento que carrega na barriga! – Gritou como nunca tinha gritado com alguém antes.
- Meu catarrento? Desgraçada, não adianta fingir que não sabe de toda a história, que não sabe que é do Kadu, porque foi você que espalhou.
- Está vendo como você é um jegue? Um João ninguém? Você é um derrotado, Rafael, acreditou na primeira mentirinha que te contaram, infeliz. Você acha mesmo que alguém, além de um desclassificado como você, iria querer aquele projeto de gente que se chama Mellanie? A cria é sua e eu tenho profunda pena dela. – Sentiu as veias dos olhos latejarem com a ira que estava sentindo dentro de si e, nos mesmos passos firmes com que tinha o encontrado, ela saiu em direção à calçada, mas não viu Daniel que, provavelmente, não sabia onde ela tinha ido e já teria sido levado ao hospital pelo pai. Deu as costas e chamou um taxi, deixando Rafael na completa escuridão.
~ Ѽ ~